Livros, música, cinema, política, comida boa. Isso tudo e mais um montão de tranqueiras dentro de um baú aberto.

domingo, 25 de outubro de 2009

A melhor cantora, hoje.

O Brasil sempre foi muito abundante de boas cantoras. Sempre teve, tem e sempre terá algumas maravilhosas. Divinas, majestosas, suaves, apimentadas. Gosto de muitas delas.

Hoje, sem nenhuma dúvida, a cantora que mais me emociona, de longe, é Mônica Salmaso.

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sexta-feira, 23 de outubro de 2009

Pompa

Genialidade e virtuosismo, em música, são características invejáveis, entretanto, raras. Enquanto uma gera grande resultado criativo, o outro garante apuro na execução, proporcionando resultado igualmente embevecedor. Já que raras, são características quase impossíveis de se encontrar juntas, numa só pessoa. Assim, tão feliz combinação é mais fácil de ocorrer na união de talentos.

Pois foi felicidade, justamente, o que eu senti ao ouvir, já na primeira oportunidade, o disco de Guinga com Paulo Sérgio Santos, Saudade do Cordão.
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Di menor (Guinga e Celso Viáfora)
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Guinga é capaz de verdadeiras atrocidades quando a tarefa é exterminar o lugar comum. Suas músicas são sempre especiais, nunca ralas. Por muitos, considerado irascível, característica dos gênios, sua obra é respeitada e, muitas vezes, cultuada por qualquer ser que consiga identificar qualidade na combinação de notas musicais. Dono de um dedilhado preciso, é na criação das melodias e harmonias, entretanto, que seu talento se expressa com maior fulgor.

Não tenho conhecimento de alguma obra composta por Paulo Sérgio Santos. Conheço há muito, entretanto, a qualidade interpretativa do clarinetista do Quinteto Villa Lobos. Seu virtuosismo trafega do erudito ao popular, sem que ele tenha de lançar mão de malabarismos, recurso muito empregado por inúmeros instrumentistas. Transita entre Bach e Pixinguinha com a naturalidade de quem sabe tratar-se da mesma coisa.

Juntar estes dois monstros da nossa música, gênio e virtuose, só poderia dar no resultado que deu: um disco inebriante. Só mesmo esse som pra me motivar a escrever um texto tão recheado de termos pomposos. Não poderia ser diferente. Esse disco merece pompa.

domingo, 11 de outubro de 2009

Ciência e fé

Não foi por coincidência que o fim da minha fé em deus aconteceu no momento em que eu ingressei na escola técnica, aos 14 anos. Afinal, a intimidade com os átomos e as moléculas e tudo o que podia ocorrer com eles, devidamente comprovado nos laboratórios de física e química, pareceu, aos meus jovens olhos, incompatível com as crenças que a família tentava incutir em minha mente. Empreendi, naquele momento, uma peleja contra a fé, sempre aparado no conhecimento científico que começava a desvendar, excitado.

Com o tempo, minha crença não ressurgiu, mas aprendi a respeitar e, até mesmo, a entender o efeito que a fé pode causar nas pessoas, em grande parte das vezes, um efeito positivo. Percebi o quanto esta fé pode fazer bem a essas pessoas e o quanto a existência deste suporte pode servir de alento e até mesmo de consolo, nos momentos difíceis pelos quais, todos nós, acabamos passando. Hoje, lido muito bem com qualquer manifestação de fé que as pessoas possam ter, respeitando o direito de todas elas escolherem seu caminho. Minha tolerância não é tão elástica em relação às igrejas que canalizam, formatam e manipulam esta fé.

No fim de tudo, é sobre isso que trata o livro A goleada de Darwin, de Sandro de Souza. Em 90% dos seus capítulos, ele trata do debate entre criacionismo e darwinismo, quando levados aos bancos escolares, sobretudo nos Estados Unidos. Mostra o quanto uma grande parcela daquela sociedade rejeita a teoria de Charles Darwin e como, no início do século passado, foi difícil ensiná-la nas escolas americanas. Hoje, depois da batalha ganha pela teoria da evolução das espécies, existe, ainda, um forte movimento no sentido que se ensine, também, outra versão da história, baseada na crença da criação do universo e, sobretudo, da humanidade, por uma entidade divina.

O livro não rejeita este ensino. O livro resiste a que esse ensino seja feito nas aulas de ciência. E nesse ponto, concordo plenamente com ele. Acho lícito ensinar essa versão do caminho que criou a vida numa aula de teologia, filosofia, ou até mesmo de história. Nas aulas de ciências ou biologia deve-se ensinar o que está cientificamente comprovado, ou seja, a teoria da evolução da espécie e da seleção natural, desenvolvida por Charles Darwin, mais de 100 anos atrás.

A principal conclusão do livro, afinal, é, justamente, perceber que ciência e fé podem caminhar juntas, contanto que cada uma ocupe o seu lugar na mente das pessoas e, principalmente, nos bancos escolares.

domingo, 4 de outubro de 2009

Aos 74 anos, morre La Negra


A primeira vez que fui a Buenos Aires foi numa viagem de trabalho. Meu portuñol era muito pior do que é hoje e eu ainda não fora apresentado à carne argentina e ao tango, duas das minhas paixões atuais. Dos argentinos eu só conhecia Mercedes Sosa e Violeta Parra, já que as canções desta, na voz daquela, embalaram meus sonhos na juventude. Foi uma época em que eu tinha esperança nos homens. Conhecia tão pouco a Argentina que achei, até hoje, que Violeta Parra fosse de lá, mas era chilena, me corrigiu o bom amigo Bruno Ribeiro.

Naquela viagem, indo de taxi para o trabalho, vi um cartaz que anunciava um show com La Negra, naquela semana. Era um teatrão antigo e imponente, na Avenida Corrientes, próximo ao hotel em que eu estava hospedado, na região central da cidade. Fui à bilheteria e comprei um lugar na primeira fila do balcão superior. Na platéia não havia mais lugar.

A primeira parte do show foi só com músicas mais modernas, com participações de artistas, até então, desconhecidos pra mim, como Fito Paes e Charly Garcia. Foi um bom show, mas eu sentia um certo vazio, ansioso por ouvir as canções que embalaram a minha mocidade. Após o intervalo, ela volta e começa a cantar todos os clássicos de Violeta Parra, Victor Jara, Athaualpa Yupanqui. Não tive como segurar as lágrimas. Eu estava lá, sozinho e longe das pessoas que mais amo e, ao mesmo tempo, muito perto de mim. Perto da pessoa que havia sido anos antes, cheio de sonhos e esperanças.

Morreu Mercedes Sosa, muito tempo depois que morreu, em mim, a esperança. Mesmo assim, sinto saudades. Saudades de um tempo, saudades de uma cantora, saudades de mim.





sábado, 3 de outubro de 2009

E o povo, pra variar, dança

O Rio de Janeiro vai realizar os Jogos Olímpicos de 2016. Assim que o resultado saiu, foi anunciado pelos principais sites de notícias on-line que exibiram fotos do povo dançando nas ruas, em comemoração. É a comemoração da amnésia.

Esqueceu-se, já, tão cedo, da farra que foram os Jogos Pan-americanos, com obras super faturadas e uma herança inútil para a cidade do Rio de Janeiro, a mesma de agora. Esqueceu-se das promessas não cumpridas, de antes do Pan. Esqueceu-se da engenhoca que é o Engenhão, estádio tão indesejado que foi cedido a um clube que deve cair pra segunda divisão. Estádio que não vai servir pra Copa e que não vai servir pros Jogos Olímpicos. Não serve pra nada. Esqueceu-se que a prestação de contas não foi prestada, virou tudo um faz-de-conta.

Estão comemorando, a Rede Globo e os grandes jornais brasileiros, de olho nas verbas de publicidade que o governo, certamente, vai despejar na grande mídia. Estão comemorando as empreiteiras, de olho nas obras que vão fazer com o dinheiro público, o nosso dinheiro. Aliás, a comemoração é dupla, já que teremos Copa do Mundo, em 2014, e Olimpíadas, em 2016. Vai ser uma festa, uma gastança.

Já posso ver o atraso nas obras e no planejamento, o que vai acabar justificando a falta de licitação para contratar as empresas. Exatamente como aconteceu no Pan. Será que ninguém se lembra disso? Será que toda essa gente, que dança nas ruas, prefere que seu dinheiro seja utilizado pra construir estádios, em cidades onde não há times de futebol, ao invés de colocar remédios nos hospitais públicos? Será que não percebem que um evento defendido por João Avelange e Carlos Arthur Nuzman não merece crédito?

O Presidente Lula está radiante. Como todos os políticos, aliás. Afinal, em 2014, ano da Copa, o candidato Lula vai estar em plena campanha, assim como Serra, ou Aécio, até Ciro Gomes. Qualquer um que seja eleito vai pegar os Jogos Olímpicos no meio do mandato. Mais motivo de festa. Mas isso é natural da política. O que me preocupa é a comemoração dos outros. Daqueles que vão ganhar muito dinheiro sem investir um centavo, daqueles que vão conseguir financiamento a juros mais baixos do BNDES.

Comemoram os Marinhos, os Frias, os Mesquitas, os Odebrechts, os Correias, os Gutierres. Todos eles comemoram, mas quem dança, pra variar, é o povo.
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