Desde que surgiu este dilema das biografias
autorizadas, me senti meio que em cima do muro, posição que, em geral, me
incomoda. Confesso que mantive esta posição um pouco por preguiça e, por isso,
não me sentia motivado a ler mais sobre o que estava se passando, já que,
embora seja um grande admirador da obra de Chico Buarque, Gilberto Gil, Caetano
Veloso e, até mesmo, de algumas canções do Roberto Carlos, tenho muito pouco
interesse pelas opiniões deles a respeito de assuntos gerais e, muito menos, de
detalhes sobre suas vidas privadas. Aliás, a vida privada das pessoas me
interessa quase nada. Por outro lado, a biografia chapa branca sempre me deixa
bastante desconfiado, com a sensação de estar sendo ludibriado. Acabei vencendo
a preguiça e escolhi uma posição que, neste momento, pouco importa, visto que este
assunto já esfriou.
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De qualquer forma, tenho de confessar que gosto de
ler biografias, principalmente aquelas em que o foco principal seja a obra (ou
o pensamento) do biografado e não tanto a sua vida privada. E gosto muito de
ler entrevistas, também. Aliás, acho que gosto mais de ler entrevistas, já que
esta fica no meio do caminho entre a biografia não autorizada e a de chapa
branca. O problema é que entrevista, em geral, é uma coisa datada, que reflete
a opinião do entrevistado naquele momento, e que pode mudar em pouco tempo, em
função de alguma reflexão mais profunda ou de algum acontecimento inesperado.
Por isso mesmo, é sempre muito estranho ler entrevistas antigas.
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O que dizer, portanto, de ler uma entrevista feita
há mais de 30 anos? Faz algum sentido?
Pode até fazer, principalmente se o entrevistado, logo depois dela, não tiver
tido a chance de refletir ou ver as voltas que o mundo deu. E foi exatamente o
que me motivou a ler A última entrevista de John Lennon e Yoko Ono, conduzida
por David Sheff, à época, jornalista escalado pela revista Playboy para esta
tarefa, transformada em livro. A entrevista aconteceu em algumas sessões na
casa do ex-Beatle, em seu escritório e no estúdio em que estava sendo gravado o
último álbum lançado por ele, Double Fantasy. Poucos meses depois, Lennon seria
baleado em frente à sua casa.
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Apesar de datadas, algumas de suas posições a
respeito de política e, principalmente, sobre a paz, parecem atuais. Fica uma
sensação de que nenhuma reflexão ou acontecimento histórico teria mudado sua
maneira de pensar e enxergar o mundo, não que isso fosse ruim, muito pelo
contrário, mas sua argumentação era tão consistente que poderia ser utilizada
mesmo hoje em dia, com mais de 70 anos, caso estivesse vivo. Os detalhes de seu
relacionamento com os outros Beatles, assim como com Yoko Ono, longe de serem tratados
como fofoca, servem como pano de fundo fundamental para entender sua obra e sua
forma de pensar.
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É a respeito de sua obra, aliás, que o conteúdo da
entrevista mais me seduziu, justamente na parte em que, a convite do
jornalista, ele comenta cada uma das mais importantes canções produzidas
durante a carreira solo ou juntamente com os Beatles. Para quem foi um
beatlemaníaco extemporâneo, como eu, foi absolutamente delicioso conhecer os
detalhes das composições daquele que sempre foi meu Beatle preferido.
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