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quarta-feira, 17 de outubro de 2018

O poder da argumentação


Devido ao meu apego às eleições, do qual já falei anteriormente, neste período de campanha política eu me sinto muito estimulado a debater e isso acontece desde sempre. Desde quando ainda não havia redes sociais (sim, garotos, já houve um tempo em que não existiam redes sociais como as de hoje). Em outras épocas se debatia nos bares, na universidade, na fábrica e, em todos estes ambientes, gostei, sempre, de debater e expor meu ponto de vista.

Debater nestes ambientes, aliás, sempre me pareceu mais saudável do que o que acontece agora. A primeira diferença é que os debates eram preponderantemente baseados em argumentos. Hoje, você coloca um argumento na rede e, recebe, de volta a expressão: “não concordo!”. Aí, fica esperando a próxima mensagem, com o contra-argumento, mas ele não chega.

Pode receber, de volta, o desenho de uma bonequinha dançando de havaiana ou a sigla e o número de algum candidato. Quando muito, recebe, do interlocutor, uma mensagem absolutamente desconectada do tema que foi proposto. Acho que está ocorrendo uma dislexia generalizada nas pessoas. Elas não estão conseguindo concatenar as ideias ou formular frases minimamente relacionadas a um tema específico, sem falar da estupidez que é a utilização da agressividade como ferramenta de argumentação.

Como sempre faço em épocas de eleição, eu estava preparado para debater, utilizando, como base, meus estudos, valores e reflexões, ou seja, tudo aquilo que constrói as nossas convicções e embasam nossos argumentos.

Estava preparado para debater com os petistas, não utilizando aqueles argumentos de que só o PT praticou corrupção, que em seu governo a corrupção foi maior do que nunca, de que no regime militar isso não ocorria e outras tolices, pois, nesta esparrela só caem os muito ingênuos ou os mal-intencionados (aliás, terei, eternamente, a dúvida de qual destas duas categorias é mais nociva para o mundo). Meu debate com os petistas tem sido em outra direção. Tem sido na cobrança do partido ter adotado, ao chegar ao poder, os mesmos procedimentos que sempre foram a marca registrada daqueles que estavam à sua direita. No fato de, no poder, Lula ter transigido tanto e atendido, tão fortemente, às demandas da camada da população que, desde sempre, tem sido a mais favorecida. Por que é que os inegáveis avanços sociais implementados foram tão tímidos?

Estava preparado para debater com os tucanos e cobrar, deste partido, o distanciamento monstruoso que foi promovido, em relação à sua ideia original. A continuidade do uso da Social Democracia no nome desta agremiação que, hoje, é mais liberal que o próprio DEM (ou PFL, ou PDS ou ARENA, tanto faz). Por traírem os ideais de tucanos históricos como Mário Covas, Euclides Scalco ou José Richa (este, aliás, foi traído pelo próprio filho).

Estava preparado para debater com eleitores de Marina e mostrar que seu discurso é sempre vazio e inconsistente. Este debate, aliás, nem seria necessário pois, como sempre, esta candidata acaba se transformando no próprio argumento contra si.

Estava preparado, até, para explicar para os eleitores de João Amoedo e de seu partido (que de novo só tem o nome) que só quem nunca leu Aristóteles pode se apresentar ao eleitorado como um “não político”. Afinal, o grande filósofo já ensinou, há mais de 2.300 anos, que o homem é um animal político.

O que eu não estava esperando é que teria que debater com as pessoas e afirmar (e reafirmar) que sou contra a tortura, contra o racismo, contra a homofobia, contra a misoginia, enfim, contra toda forma de violência que se possa praticar a um ser humano.

Nunca imaginei que teria que mostrar para as pessoas que não acho admissível um candidato falar em eliminar (ao invés de vencer) um adversário.

Nunca passou pela minha cabeça que eu teria que explicar que a democracia foi um bem conquistado pela nossa sociedade à custa de derramamento de sangue, assassinatos e desaparecimento de pessoas que tinham opiniões distintas de quem detinha o poder no regime militar.

Enfim, julguei (talvez ingenuamente), que estas coisas eram tão básicas, tão óbvias, tão absurdamente evidentes, que não careciam de qualquer tipo de argumentação para serem defendidas.

Esta etapa da eleição, que se avizinha, deixou de ter um caráter apenas ideológico. Não é, como deveria, matéria de qualquer tipo de argumentação. Nesta eleição, o que está em jogo é uma escolha escandalosamente simples. É a escolha entre a civilidade e a barbárie. E é assustador que ainda haja, na nossa sociedade, uma dúvida como esta.



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