Sou de outro
tempo. Do tempo em que não havia eleições para todos os cargos, no Brasil. A
primeira eleição de que participei foi para senador (votei em Fernando Henrique
Cardoso, que entrou como suplente), mas, naquela época, não era permitido votar
para presidente, governador e nem prefeitos de capitais. Aliás, as eleições
para prefeito também eram proibidas nos municípios em “área de segurança
nacional” e nas estâncias hidrominerais. Nesta última categoria, aliás, nunca
entendi o motivo da proibição, mas quem souber a razão, não precisa me contar.
Naquela época, havia tanta coisa que não fazia sentido que esta era uma
preocupação menor.
Por
todo este histórico, me são caras as eleições. Gosto muito delas e as encaro
como uma conquista do povo brasileiro, depois de 21 anos sob um regime militar
em que, não só os direitos básicos foram surrupiados, mas, também, a dignidade
e, em muitos casos, a vida.
Por
tudo isso, também, sempre resisti a praticar o voto nulo ou em branco e,
confesso, tive medo de ser obrigado a fazer isso nestas eleições, caso a
disputa para governador de São Paulo ficasse restrita à escolha entre Dória
(aquele que tem um sorriso nos lábios e ódio no olhar) e Scaf. Felizmente, fui
salvo pelo gongo e poderei depositar meu voto em Márcio França, como já havia
feito no 1° turno.
Outra
conquista que tivemos foi a instauração do 2° turno nas eleições para os cargos
executivos. Sem ele, com a quantidade insana de partidos políticos que temos no
Brasil, estaríamos ameaçados, a cada eleição, a ver eleito um candidato que
tivesse menos que 15% dos votos totais. Só na eleição deste ano, tivemos 13
candidatos!
Assim
como o 1° turno serve para que cada um escolha o candidato que considere o mais
apropriado, o 2° é feito para que se escolha o menos ruim. O 2° turno é,
também, a oportunidade de se formar alianças políticas, instrumento muito
importante para equalizar programas e, com isso, buscar a ampliação do
eleitorado. Há quem confunda aliança política com conchavo, mas são coisas
completamente diferentes. Conchavo, normalmente, é feito no subterrâneo, no
escuro, com o propósito de satisfazer interesses escusos. Alianças,
normalmente, devem ser feitas à superfície, às claras. A boa política é a arte
de saber dialogar e negociar para se chegar a uma agenda comum que atenda as
expectativas de uma camada maior de eleitores.
A
importância maior, entretanto, do 2° turno, é a possibilidade de embate entre
os dois candidatos, com mesmo espaço de tempo para expor suas ideias e seus
programas. É nesta oportunidade, efetivamente, que as diferenças de proposta de
governo podem ser avaliadas pelos eleitores, através das argumentações e contra-argumentações
que este evento propicia.
Nas
eleições deste ano, esta oportunidade não está sendo propiciada ao eleitor
devido à fuga do candidato Bolsonaro, o que demonstra, claramente, seu desapego
à democracia (além da covardia, é claro). Além disso, parte dos eleitores fizeram
uso do chamado “voto útil” no 1° turno e abandonaram os candidatos que consideravam
a melhor opção para tentar forçar a não realização do 2°. Este é um erro,
politicamente, grosseiro, e explico o motivo.
Ao
esvaziar a sacola de votos do candidato que considera a melhor opção, o eleitor
esvazia, também, o capital político dele, no momento de se fazer as alianças
para a segunda rodada da eleição. Com isso, as ideias e os pontos do programa
que motivaram o eleitor a preferir tal candidato, acabam não tendo chance de ser
incorporados ao programa daquele que, efetivamente, recebeu seu voto. Assim, o
eleitor vai para o 2° turno depositando voto em um candidato que não tem, em
sua plataforma de campanha, os pontos que eram contemplados por seu candidato
inicial e que, portanto, ele julga importantes.
A
maioria dos eleitores que preferiam Alckmin, Amoedo, Meirelles e Marina,
mudaram, no último momento, para Bolsonaro. Com isso, deixaram seus candidatos
preferidos sem capital político para negociar a inserção de suas propostas na
campanha do capitão do exército, numa eventual aliança política. Desta forma,
este eleitor acabou perdendo dos dois lados. Nem evitou o segundo turno nem
conseguiu ver as ideias nas quais, realmente, acreditava, inseridas no programa
do candidato em que votou.
Votei
em Ciro Gomes no 1° turno e votarei em Fernando Haddad no próximo dia 28. Por
valorizar tanto as eleições, eu nunca questiono a decisão dos eleitores. Isso,
pra mim, é sagrado. Por isso, como eleitor, vou acatar a decisão da maioria,
mesmo que a considere equivocada. Sou, acima de tudo, um democrata.
E por
ter esta preferência pelos regimes democráticos, votaria em qualquer outro
candidato que não fosse o capitão do mato, pois, como eu disse no início do
texto, sou de outro tempo. Aquele em que a democracia era inexistente no nosso
país e sei muito bem como é viver num ambiente destes.
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