Livros, música, cinema, política, comida boa. Isso tudo e mais um montão de tranqueiras dentro de um baú aberto.

sexta-feira, 2 de novembro de 2007

Entrevistas

Entre as muitas coisas que me angustiam, uma delas, talvez a maior, é a falta de tempo que tenho para ler. Quisera ter todo o tempo do mundo. Não ter que comer, não ter que dormir, não ter que tomar banho, não ter que ir ao cinema, não ter que trabalhar. Mas preciso trabalhar pra poder comprar comida, colchão, chuveiro, ingressos. Tenho que trabalhar pra poder comprar livros. E mesmo que não tivesse que fazer tudo isso, há essa certeza da morte, que me mostra que não conseguirei ler todos os livros que tenho. Os que tenho e os que ainda vou comprar. Os que posso pegar na biblioteca pública e os que posso baixar na internet. Por isso é que eu queria não morrer. Não é pra comer mais, nem pra namorar mais, nem pra ir mais ao cinema e muito menos pra mais trabalhar. Queria não morrer para poder viver mais. Queria viver mais pra poder ler tudo.

E se não bastassem tantos livros no mundo, tenho ainda essa compulsão em ler jornais e revistas. E nem é pra ficar bem informado, coisa que acontece cada vez menos comigo. É pelo prazer de ler as coisas que saem publicadas. E como há publicações! É angustiante. Mais angustiante. E entre o que mais gosto de ler, em jornais e revistas, estão as entrevistas. Não aquelas em que se modifica tudo o que o entrevistado disse. Não aquelas em que o repórter só faz perguntas óbvias. Não as que saem nas páginas amarelas da Veja. Não. O que eu gosto de ler são aquelas entrevistas em que os assuntos abordados são mais instigantes, aquelas em que o repórter fala menos que o entrevistado, aquelas em que algo se revela. Não me interessam as coisas pessoais. Não me interessa quem namora com quem, quem comeu que pessoa. Não leio a revista Caras. Me interessam as experiências enriquecedoras de quem viaja, as idéias de quem lê muito, os processos criativos de quem faz arte.

É por tudo isso que me causou muito prazer ler os livros Vozes do Brasil, com entrevistas dadas a Patrícia Palumbo. São dois volumes. O primeiro saiu em 2002 e o segundo acaba de sair. São publicações caprichadas, com papel de primeira, fotos ótimas. São entrevistas com nomes importantes da nossa música popular. O volume 1 traz Arnaldo Antunes, Cássia Eller, Chico Cesar, Daúde, Ed Motta, Itamar Assumpção, Lenine, Luís Melodia, Ná Ozzetti, Paulinho Moska, Rita Ribeiro, Zeca Baleiro e Zélia Duncan e o segundo volume reúne depoimentos de Adriana Calcanhoto, Ana Carolina, Elba Ramalho, Fernanda Abreu, Jussara Oliveira, Mônica Salmaso, Nando Reis, Pato Fu, Rita Lee, Tom Zé e Zizi Possi.

Fala-se da carreira dos artistas e, sobretudo, de música. Não tem fofoca. Não se aborda a vida sexual de Cássia Eller ou se Nando Reis brigou com algum integrante dos Titãs. Isso não interessa.

Por se apresentarem numa edição luxuosa, o preço dos livros é meio salgado. Mas vale a pena, já que o conteúdo é apetitoso. Além do mais, a gente trabalha pra poder ter essas coisas. E a gente não vai mesmo viver pra sempre.

8 comentários:

caçadordementes disse...

Primeiramente,parabéns pelo seu blog.
Concordo com tudo q vc escreveu,eu tb sou um leitor voraz,adoro livros,revistas,jornais...etc.Tudo aquilo q informa,não fofoca,aliás,
esse tipo de "jornalismo" me dá nojo.
abraços.

Mel disse...

Que interessante a dica, parecem muito bons esses livros, eu tbem gosto de entrevistas assim, sem apelar para o lado pessoal e sim falando da arte que é o que importa realmente.
Me sinto exatamente assim como vc descreveu, sei que por mais que eu viva uns 100 anos não será suficiente pra ler tudo que quero ou que irei querer.
Parabéns pelo blog!

Anônimo disse...

A leitura abre caminhos, transforma as pessoas e nos leva a lugares nunca imaginados. Porém quero viver muito , envelhecer rodeada de pessoas para poder contar tudo o que já li na vida.
Um abraço
Maria

ninguém disse...

Arnaldo.Partilho dessa angústia contigo. Pior: tenho culpa por não conseguir ler o que tenho em volta. Jornal, já desisti: só pela internet, e selecionando. Pior ainda: até as porcarias fofoquentas me sinto obrigada a ler por força da profissão. Estamos em plena Feira do Livro por aqui. Decidi ir no final.Assim, não compro por compulsão e não fico depois me martirizando por olhar os livros sem conseguir dar conta da leitura.
abração

MegMarques disse...

É, parece que somos um bando de leitores obsessivos-compulsivos por aqui...
Também me aflijo e angustio perante tudo o que há para ser lido e eu sei que não vou conseguir.

Be in touch: mmarques@icb.ufmg.br

Andrea Drewanz disse...

Arnaldo,
É uma pena que livros sejam tão caros e inacessíveis a grande parte da população.
Seria ótimo se existissem salas de leitura gratuitas, né?
Para mim, seria um sonho... e o difícil seria apenas tentar conciliar o tempo. Tem tanta coisa que gostaria de ler, ver, ouvir!
Voilá, ces´t la vie.

jayme disse...

Arnaldo, muito bem descrita essa sensação com os livros, eu tenho algo parecido. Quanto ao "Vozes" da Patrícia Palumbo, vale lembrar que a delícia começa pela voz dela, que eu costumava ouvir diariamente na rádio Eldorado. Vou sair em busca de mais esse livro -- e esse dever de ler, tantas vezes negligenciado. Abraço,

Vivien Morgato : disse...

Um mar de livros, palavras e blogs. Que delícia, heim?
Seu texto, como sempre, um achado!