Livros, música, cinema, política, comida boa. Isso tudo e mais um montão de tranqueiras dentro de um baú aberto.

segunda-feira, 31 de dezembro de 2007

2008 não. 2007 até o fim.

Há alguns anos, quando minha avó já tinha mais de oitenta, ela vivia dizendo que estava ficando velha, que não sabia se passaria mais um natal, se emplacaria o ano novo. Todo ano ela dizia isso, todo ano ela emplacava. Tanto que até virou motivo de brincadeira, na família, quando ela começava com esse tipo de papo. E quando começava com esse tipo de papo eu a lembrava que já tinha ultrapassado, estatisticamente, a média de vida do brasileiro. Estava, portanto, levando vantagem. Alguém estava morrendo mais cedo pra ela poder ficar acima da média. Dizia que ela estava com o prazo de validade vencido. Todo mundo ria destas piadas de mau gosto, principalmente ela.

Em abril deste ano, escrevi um post muito emocionado em que eu falava dela, aos 93 anos, com a saúde debilitada. Falei da conversa que tivemos sobre a morte. Falei de como era nossa relação.

Este ano foi muito difícil pra ela. Ficando mais tempo em hospitais do que em casa, cada vez mais debilitada, cada vez com um problema diferente. Este ano ela não falou que não emplacaria o ano novo. Mas ninguém tinha dúvidas. Nem ela.

Acabo de voltar do seu enterro, em São Paulo. Mas a imagem de seu corpo no caixão não é a que vai ficar em minha mente. As imagens que ficarão em minha cabeça são como esta, tirada mais de quinze anos atrás:


Ela com seus bisnetos, na páscoa, em sua casa.

Gosto desta imagem pois mostra bem como ela era. Ela e sua mania de esconder ovos de chocolate pra que nós os encontrássemos. Fez isso com os netos. Fez isso com os bisnetos.

Há muitas outras imagens. Muitas delas passaram em minha mente hoje. Todas ótimas de lembrar. Vão ficar estas imagens, assim como a música que ela punha na vitrola pra tocar, quando eu tinha 2 ou 3 anos.



Minha avó não vai emplacar 2008. Mas freqüentou 2007 até o último dia.

domingo, 30 de dezembro de 2007

Ouvir poesia

Eu já fui de ler poesia. Faz tempo isso. E naquele tempo, até cometi umazinhas que minha autocrítica soterrou, para o bem da humanidade. A poesia que me seduzia era a poesia rimada. E é por isso que eu gostava mais de Vinícius do que de Drummond. Depois, percebi que o que eu gostava mesmo era a poesia que se confundia com letra de música, até perceber que eu gostava mesmo era de letra de música. Até cometi outrazinhas que a mesma autocrítica salvou a mesma humanidade.

Elegi Paulo Cesar Pinheiro como minha referência. Em letra de música e em poesia. E comprei o LP com alguns poemas do seu livro Poesia Morena, declamadas por ele. O livro, muitos anos depois consegui comprar e nele a Clélia buscou uma dedicatória do autor. Percebi que preferia a poesia declamada à lida. Ouvir poesia a ler poesia. Confirmei isso ouvindo a Antologia Poética de Vinícius e de Drummond em disco.

Faz tempo que não ouço disco com poesias declamadas. Antes, cada LP que tivesse a participação de Paulo Cesar Pinheiro, tinha uma ou duas faixas com ele declamando. Nos discos antigos de Bethânia também sempre tinha. Por isso, fiquei surpreso ao ouvir o CD Paralelas de Alzira Espíndola e Alice Ruiz.

Alzira, eu conheço bem, de discos solo ou duetos com a irmã Tetê. É daquela turma de Mato Grosso da qual faz parte Almir Sater. Alice Ruiz é poeta e letrista. Parceira de Itamar Assunção, Chico Cesar, Zeca Baleiro.

Este CD mescla poemas de Alice com canções de sua autoria em parceria com Alzira. É um disco fundamentalmente feminino. Poderia se chamar Para Elas, título, aliás, de uma das canções do CD.

É bom ouvir poesia. É bom ouvir música com letra bonita. Dá uma vontade danada de se soltar, de se aventurar.

É bom que eu me contenha. Para o bem da humanidade.

sábado, 29 de dezembro de 2007

Ano Novo

Apesar de ter escrito um post sobre o natal, não me animei em escrever nada sobre o ano novo, mesmo porque, eu não conseguiria escrever algo tão bom como o que escreveu a Maristela.

quarta-feira, 26 de dezembro de 2007

Cantoras


O Brasil é prolífero em vozes femininas. Sempre tivemos cantoras excelentes para interpretar nossa rica música. Desde Dalva de Oliveira e Elizeth Cardoso, passando por Clara Nunes, Elis Regina e Maria Bethânia, todas verdadeiras divas. Mas não é só das cantoras conhecidas que se constrói este universo. Há uma infinidade, Brasil adentro, de maravilhosas vozes absolutamente desconhecidas. Algumas ansiando gravar o primeiro disco. Outras que, tendo o disco gravado, não conseguem a devida exposição na mídia, tanto por não terem um esquema poderoso de marketing por trás, quanto por não compactuarem com o esquema de jabá que impera no rádio e TV no Brasil.

Por tudo isso é que me incomoda que uma cantora como Maria Rita tenha tanto espaço. Confesso que até me interessei por seu primeiro disco. Movido pela curiosidade e bombardeado pelo maciço marketing que se fez no lançamento do CD, gostei de algumas coisas, principalmente ouvir canções de Marcelo Camelo sem ter que escutar Los Hermanos. Seu segundo disco não me interessou. Soou repetitivo e sem sal. Aliás, repetitiva e sem sal como é a sua voz. Muita gente gosta de dizer que ela canta como Elis Regina. Quem diz isso, ou não ouviu sua mãe cantar ou tem grave problema de audição. Chega a parecer sacrilégio dizer tal insanidade.

E agora, em seu terceiro CD, Maria Rita propõe emprestar sua voz enjoada pra cantar samba. E provando que não é do ramo, resolve inovar cantando samba sem batucada, cantando samba como se fosse toada, estragando composições, até que de qualidade, de Arlindo Cruz e outros compositores de algum talento. Não é a praia dela. Aliás, qual será? Será que sem este pedigree ela teria este espaço na mídia? Será que sem essa maciça campanha de marketing que acompanha cada lançamento de um disco seu, ela conseguiria vender ao menos uma centena de cópias? Acho que não. Não fossem essas ferramentas, ela seria mais uma cantora a embalar ébrios e desatentos ouvintes num boteco qualquer.

E enquanto isso, em cada boteco deste país, uma infinidade de boas cantoras mostra suas vozes pra platéias desatentas e, quase nunca merecedoras e ouvi-las. E enquanto isso há cantoras como Mariana Aydar, Fabiana Cozza, Juliana Diniz, Roberta Sá, Ana Costa, entre muitas outras, todas com ótimos discos lançados, repertório primoroso, sem a devida e merecida exposição na mídia. Eu, felizmente, tenho curiosidade suficiente pra ficar garimpando nas prateleiras das lojas e na internet, a procura destas preciosidades. E tenho tido a sorte de encontrar muita coisa de qualidade.

Mais sorte ainda eu tive, ao receber um e-mail de Andréa Dutra, com uma gravação onde ela canta um dos sambas de Paulo Cesar Pinheiro que mais gosto, em parceria com Mauro Duarte. Andréa, blogueira das melhores, é uma cantora ímpar. Faz parte do Arranco de Varsóvia e lançou um ótimo CD, acompanhada por Marcus Nabuco. Esta sim, merece brilhar.

Imbuído do tal espírito natalino, vou dividir este presente com vocês.

domingo, 23 de dezembro de 2007

João sem medo

João Saldanha foi muito popular entre as décadas de 1950 e 1970, muito conhecido como jornalista esportivo. Pois acaba de sair o livro João Saldanha - uma vida em jogo de André Iki Siqueira e, nesta biografia, mostra-se uma faceta menos conhecida de João que foi a militância. Sim, pois além de sua paixão pelo futebol, João alimentava outra que era a política.

João militou no Partido Comunista Brasileiro durante toda sua vida, sempre leal a ele e sempre muito próximo de seu comitê central. Era um militante dedicado e corajoso, tendo cumprido muitas tarefas complexas e perigosas. Foi muito ligado a Prestes, mas, quando este rompeu com o partido, João manteve-se fiel ao PCB.

A maior virtude do livro é mostrar, claramente, todas as facetas de João, o João sem medo. O João contador de histórias, nem todas verídicas, mas sempre emocionantes. Brigador, mas terno com a família e os amigos, ele não levava desaforo pra casa e não precisava de muito pra pegar um revólver e resolver alguma parada. Deu tiros a torto e a direito, mas, o único certeiro não foi dado e sim levado por ele, perfurando seu pulmão, numa invasão da UNE pela polícia.

A parte mais fascinante do livro é a que narra sua atuação como técnico da Seleção Brasileira que iria disputar o título mundial de 1970. Ele formou e treinou aquele time que depois foi entregue, de mão beijada, a Zagallo para ser campeão. O livro mostra como é difícil entender por que este comunista, em pleno regime militar, foi convidado para ser técnico da seleção, classificou-a para a Copa sem perder nenhum jogo e foi demitido alguns meses antes de ir ao México. Como o próprio João declarou: “O difícil não é entender por que fui demitido mas, sim, por que fui contratado”.

É um livro que se lê em 2 dias, apesar de suas 550 páginas. Nele percebemos que entre militante político, brigão e contador de histórias, a melhor faceta de João era a de jornalista esportivo. Foi o melhor jornalista de futebol que o Brasil já teve. Ele entendia de futebol por ter sido jogador e técnico. E entendia, sobretudo, por ser torcedor fanático do Botafogo, o que fazia com que percebesse o que se passava na cabeça do povo e, com isso, conseguia se comunicar diretamente com ele, usando a sua linguagem.

João Saldanha é de um tempo em que não era necessário ter diploma pra ser jornalista. Um tempo em que era necessário saber escrever direito pra ser jornalista. Bons tempos, aqueles.

domingo, 16 de dezembro de 2007

Final do ano

Aproxima-se o fim do ano e começam a pipocar, aqui e ali, posts sobre o natal. Em alguns blogs eu comentei, falando sempre a mesma coisa. O natal não me diz nada. Por não ser religioso e por não achar nenhuma graça nisso mesmo. Simples, assim.

Já gostei do natal. Quando eu era criança, esperava ansioso por essa noite. Ansiava pelos presentes, pela mesa farta de coisas, pelo avô vestido de papai Noel. Depois disso, eu me desinteressei.

Voltei a gostar do natal quando as crianças nasceram. Quando a Cecília, a Bá e o Cauê acreditavam que não era eu que estava naquela roupa vermelha e quente. Mas as crianças foram crescendo e a coisa perdeu a graça, novamente. Faz tempo que já não suporto as mesas fartas sempre com as mesmas coisas. E os almoços com as sobras da mesa farta do jantar do dia anterior.

Este ano resolvi inovar. Chamei meu pai, minha irmã, meu cunhado e as crianças pra virem aqui pra casa. Quero fazer um jantar sem peru, sem pernil, sem bacalhau. E quero fazer um almoço que não lembre em nada o jantar da noite anterior. Estou excitado pra exercitar minha criatividade na cozinha.

O que eu tenho ansiado fortemente é pelo final do ano. Tenho ansiado as duas semanas que terei de férias, pra ver se consigo descansar um pouco, pra ver se consigo relaxar um muito. Pra colocar leitura e discos em dia. Eu esperava que esta última semana, antes das férias, seria um prenúncio deste relaxamento. Que eu iria poder desacelerar o ritmo, que eu poderia levar o trabalho em banho-maria, sem tanto estresse, sem muita briga, sem nenhuma viagem.

Qual nada. Viajo, ainda hoje pra Marabá, no Pará, e só volto no meio da semana. Tenho que encarar mais essa. A última do ano. Assim espero.


domingo, 9 de dezembro de 2007

Fome de São Paulo

Estávamos em São Paulo. Engarrafados, enrolados, ocupados com milhões de coisas. E aí, de repente, bateu aquela fome. Uma fome arretada, uma fome nordestina. Uma fome que só uma carne de sol com jerimum e macaxeira resolveria. Fomos, então, ao Andrade.

O Andrade é, há muitos anos, o maior reduto da comida nordestina em São Paulo. Lá se pode comer bem e fartamente qualquer comida do nordeste. É a melhor carne de sol da cidade e o melhor baião-de-dois que eu já provei. Fomos na tarde de sábado, 3 da tarde, já. Pouca gente, do jeito que nós gostamos. Isso não é normal, por lá. Nas noites que se aproximam do final de semana e no almoço do domingo aquele lugar fica apinhado de gente. Gente que vai pra comer e pra ouvir e dançar forró. O forró autêntico. Como deve ser.

O bom de estar em São Paulo é poder aproveitar as oportunidades. Mesmo estando enrolado, mesmo estando atrapalhado. É em São Paulo que eu mato as minhas fomes.


domingo, 2 de dezembro de 2007

Porque torci contra o Corinthians

Eu nunca torço contra. Quem já leu algum texto meu, aqui neste blog, falando de futebol, sabe que eu gosto muito mais do jogo do que de torcer. É claro que eu gosto de ver meu time vencer, mas eu só gosto quando o São Paulo vence jogando bem. E gosto quando o São Paulo vence os times mais fortes. Por isso, não me empolguei nem um pouco quando ele foi campeão com tantas rodadas de antecedência. Nenhum jogo do São Paulo, neste campeonato, me empolgou. E não tenho essa coisa de rivalidade. E se tivesse, gostaria de ver sempre os rivais do meu time em boas condições, pra poder vencê-los. Nunca achei graça em bater em bêbado ou chutar cachorro morto.

Mas, como eu disse, esse negócio de rivalidade não me pega. Minha torcida segue uma lógica regional, diferente da maioria das pessoas. Torço pro São Paulo contra qualquer outro time. Torço pra qualquer time do estado de São Paulo contra o de qualquer outro estado. Torço pra qualquer time brasileiro contra qualquer time estrangeiro. Torço pra Argentina contra um time da Europa.

Nunca torço contra, mas hoje torci contra o Corinthians. Torci pra que ele caísse pra segunda divisão. E não foi por rivalidade e nem por ser anti-corintiano. Não sou anti-nada. Torci pra que ele caísse porque gosto de futebol. Torci pra que ele caísse pra que não fosse premiada uma fórmula que buscou o sucesso fácil através de um dinheiro escuso. Torci contra a maracutaia, contra a falta de ética. Torci contra a máfia russa. Torci contra uma fórmula que privilegia os fins sem se importar com os meios.

Senti tristeza ao ver, na TV, o choro honesto de alguns jogadores. Senti pena de Betão, talvez o mais sincero dos jogadores corintianos. Percebi o sofrimento da torcida no estádio. Mas me lembrei de que uma parcela desta torcida chegou a tecer loas a Kia Joorabchian nos tempos áureos da parceria com a MSI. Tempos em que muita gente fechava os olhos pra direção de onde vinha o dinheiro. Gente que apostou no vale-tudo.

Tive mais vontade de torcer contra, aliás, quando vi o técnico do time tentando convencer os jogadores adversários a “pegarem leve”, já que eles não tinham mais chance de se classificar pra copa Libertadores devido ao resultado de um outro jogo.

Torci contra, pois não tolero covardia. Torci contra o Corinthians porque gosto muito de futebol.

quinta-feira, 29 de novembro de 2007

Por fora do poder

Assim que terminei de ler A Mosca Azul, de Frei Betto, escrevi um post falando do livro, da forma com que o autor descrevia sua visão de mundo e de como o poder pode deturpar ideais e corromper pessoas. Gostei do viés filosófico que ele escolheu para expor as idéias e justificar suas crenças. Lembro-me, entretanto, que senti falta, naquele livro, de uma narrativa mais factual, já que ele havia passado dois anos dentro do governo, numa função de assessor especial de Lula, sem status de ministro, mas com muita proximidade do presidente.

Pois agora, acabo de ler o livro O Calendário do poder, em que ele narra exatamente esta experiência que teve durante estes dois anos. E utiliza um formato de diário em que coloca suas impressões a respeito de tudo o que acontecia no dia-a-dia do governo.

Sem esconder sua discordância em relação à condução da política econômica pela dupla Palocci-Henrique Meireles, ele nos revela, também, as agruras para se relacionar com os ministros José Dirceu e Luiz Gushiken, investidos de super poderes e contaminados pela típica arrogância que o poder propicia.

Mostra sua luta inglória para impedir que o programa Fome Zero não fosse encarado como um programa assistencialista, o que acabou acontecendo por absoluta incompetência do próprio governo em mostrar sua verdadeira face. Mostrou como os dois ministros que estiveram à frente das políticas sociais, Francisco Graziano e Patrus Ananias, foram ineptos para conduzi-las.

Em sua narrativa, o que se percebe é uma pessoa absolutamente ideológica e com ações conduzidas na direção de conquistas para a parcela mais miserável do nosso povo. Não encontrou eco em nenhuma outra esfera do poder federal, esferas nas quais identificou claramente a ideologia neo liberalista, herança dos governos tucanos de Fernando Henrique Cardoso. Sem encontrar este eco, dois anos depois, cansado desta luta e convencido que, ele próprio, não tinha vocação para o serviço público, resolveu se afastar, sem, entretanto, romper formalmente com o governo.

É perceptível, também, uma certa dose de ingenuidade no trato da política de bastidores. Fica a sensação de um cordeiro no meio de uma matilha. Um cordeiro imperceptível que nem provoca a fome dos lobos, interessados em rebanhos maiores e mais suculentos.

Termina o livro reafirmando, claramente, sua fé no socialismo, mas reconhecendo as dificuldades em se lutar contra os interesses das elites dominantes. Reconhece, demonstrando certo cansaço, que não vê saída para questões tão primárias que ainda assolam o nosso país como a reforma agrária, a violência urbana, a defesa da natureza e a fome, que, inacreditavelmente, muita gente ainda insiste em negar a existência.

domingo, 11 de novembro de 2007

Acústico

O conceito dos discos unplugged da MTV me agrada. Aquela idéia de se pegar bandas de rock altamente eletrificadas e fazê-las reproduzir sua música apenas com instrumentos acústicos me seduz por permitir perceber a eventual beleza de suas letras e melodias, muitas vezes encobertas pelo som metálico das guitarras. O primeiro disco com este conceito que eu ouvi foi o de Eric Clapton. Gostei muito.

A MTV brasileira copiou esta idéia e criou vários discos acústicos. Tenho alguns deles. Gosto muito de uns, nem tanto de outros. E agora, acaba de sair o CD Paulinho da Viola – Acústico MTV.

Gosto de quase todo tipo de música, mas é o samba que me emociona. O samba de verdade, diga-se de passagem. O autêntico. Aquele chamado “de raiz”, apesar de esta qualificação estar virando uma marca. E embora minha principal referência no samba seja Cartola, Paulinho da Viola sempre me comove. Por suas músicas, por sua forma de cantá-las, por sua postura em relação às coisas do mundo.

Diz-se, de Paulinho da Viola, que ele demora muito pra lançar um disco novo. Isso é até verdade. Em média, nas últimas décadas, os lançamentos de seus discos têm espaçamento médio de 6 ou 7 anos. Quando nos brinda com um disco, entretanto, sempre nos apresenta verdadeiras obras primas.

Este acústico saiu apenas 4 anos após seu último disco, a trilha do ótimo filme Meu tempo é hoje. Talvez por isso, apresente somente 4 novas canções e, mesmo assim, uma delas, o samba Ainda Mais, já foi gravado no CD Um jeito de fazer samba, de Eduardo Gudin, seu parceiro nesta música. Está aí, aliás, uma grande evolução na música de Paulinho da Viola, ou seja, a profusão de parceiros com quem ele tem composto, nos últimos tempos. E seguindo este fenômeno, a mais feliz surpresa do novo disco é exatamente a canção Talismã, uma inesperada parceria sua com Arnaldo Antunes e Marisa Monte. Uma verdadeira jóia.



O ponto negativo, em minha opinião, fica por conta da gravação de Tudo se transformou, justamente a música de Paulinho da Viola que eu mais gosto. Pois neste disco ele gravou este samba num andamento bem mais lento, acompanhado apenas de um piano. E embora este piano seja do ótimo Cristóvão Bastos, achei que o resultado ficou menor. Menor que o disco. Menor que Paulinho da Viola. Um pequeno deslize, porém. Um mínimo deslize em meio a tantos acertos. Nada que comprometa este excelente CD.

sexta-feira, 2 de novembro de 2007

Entrevistas

Entre as muitas coisas que me angustiam, uma delas, talvez a maior, é a falta de tempo que tenho para ler. Quisera ter todo o tempo do mundo. Não ter que comer, não ter que dormir, não ter que tomar banho, não ter que ir ao cinema, não ter que trabalhar. Mas preciso trabalhar pra poder comprar comida, colchão, chuveiro, ingressos. Tenho que trabalhar pra poder comprar livros. E mesmo que não tivesse que fazer tudo isso, há essa certeza da morte, que me mostra que não conseguirei ler todos os livros que tenho. Os que tenho e os que ainda vou comprar. Os que posso pegar na biblioteca pública e os que posso baixar na internet. Por isso é que eu queria não morrer. Não é pra comer mais, nem pra namorar mais, nem pra ir mais ao cinema e muito menos pra mais trabalhar. Queria não morrer para poder viver mais. Queria viver mais pra poder ler tudo.

E se não bastassem tantos livros no mundo, tenho ainda essa compulsão em ler jornais e revistas. E nem é pra ficar bem informado, coisa que acontece cada vez menos comigo. É pelo prazer de ler as coisas que saem publicadas. E como há publicações! É angustiante. Mais angustiante. E entre o que mais gosto de ler, em jornais e revistas, estão as entrevistas. Não aquelas em que se modifica tudo o que o entrevistado disse. Não aquelas em que o repórter só faz perguntas óbvias. Não as que saem nas páginas amarelas da Veja. Não. O que eu gosto de ler são aquelas entrevistas em que os assuntos abordados são mais instigantes, aquelas em que o repórter fala menos que o entrevistado, aquelas em que algo se revela. Não me interessam as coisas pessoais. Não me interessa quem namora com quem, quem comeu que pessoa. Não leio a revista Caras. Me interessam as experiências enriquecedoras de quem viaja, as idéias de quem lê muito, os processos criativos de quem faz arte.

É por tudo isso que me causou muito prazer ler os livros Vozes do Brasil, com entrevistas dadas a Patrícia Palumbo. São dois volumes. O primeiro saiu em 2002 e o segundo acaba de sair. São publicações caprichadas, com papel de primeira, fotos ótimas. São entrevistas com nomes importantes da nossa música popular. O volume 1 traz Arnaldo Antunes, Cássia Eller, Chico Cesar, Daúde, Ed Motta, Itamar Assumpção, Lenine, Luís Melodia, Ná Ozzetti, Paulinho Moska, Rita Ribeiro, Zeca Baleiro e Zélia Duncan e o segundo volume reúne depoimentos de Adriana Calcanhoto, Ana Carolina, Elba Ramalho, Fernanda Abreu, Jussara Oliveira, Mônica Salmaso, Nando Reis, Pato Fu, Rita Lee, Tom Zé e Zizi Possi.

Fala-se da carreira dos artistas e, sobretudo, de música. Não tem fofoca. Não se aborda a vida sexual de Cássia Eller ou se Nando Reis brigou com algum integrante dos Titãs. Isso não interessa.

Por se apresentarem numa edição luxuosa, o preço dos livros é meio salgado. Mas vale a pena, já que o conteúdo é apetitoso. Além do mais, a gente trabalha pra poder ter essas coisas. E a gente não vai mesmo viver pra sempre.

domingo, 28 de outubro de 2007

Outra viagem

A primeira vez que viajei de avião foi para ir pra Alemanha. Poucas vezes havia saído do estado de São Paulo e já tinha 30 anos. A partir daí, viajo pra lá ao menos 2 vezes por ano. Enchi meus passaportes de carimbos.

As primeiras viagens tiveram durações bem longas, com mais de 2 meses cada uma delas. Lembro-me da grande saudade que eu sentia. Saudade da Clélia e da Cecília. Saudade da nossa comida, da nossa música, da nossa língua. Saudade do Brasil.

A sensação que eu tive nos primeiros dias da primeira viagem foi muito negativa. Naquele tempo, eu ainda acreditava que um povo poderia ser classificado de forma simplista. Aquela coisa de que todo brasileiro é alegre, todo argentinho arrogante, todo japonês tímido, todo alemão grosseiro, todo italiano falastrão. Aos poucos, fui percebendo que todo mundo é igual. Em todo lugar há gente
boa e má, gente feliz e triste, gente egoísta e solidária.
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Lembro-me que o que mais me chocou, na Alemanha, foi a extrema limpeza das ruas, a pontualidade das pessoas, a organização de tudo. Na Alemanha é praticamente impossível ver alguém jogando um pedaço de papel no chão ou um carro atravessar o sinal vermelho. Aquilo me dava uma sensação bem ruim. Uma constatação de que aquele povo era mais educado que o povo brasileiro. Que aquela gente tinha mais preparo para conviver coletivamente, mais respeito pelo próximo. E reforçava um tipo de preconceito que era tudo o que eu sempre combatera.
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Fiquei mais aliviado quando viajei, num feriado, pra Itália e vi uma imensidão de alemães emporcalhando as ruas com latas de cerveja e bitucas de cigarro, e seus carros cruzando os sinais vermelhos. Pude perceber que aquela educação toda que eles tinham na Alemanha era a custa de pesadas penalidades que sofriam em seu país, caso tivessem este comportamento. Bastava estar num lugar onde as leis eram mais frouxas para se comportarem como todos os outros povos. Passei a sentir mais simpatia pelos alemães.
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Conhecer muitos países foi o que aconteceu de mais proveitoso nessas minhas viagens de trabalho. Lembro-me que todo feriado, todo final de semana prolongado era uma oportunidade pra viajar. Íamos, sobretudo pra Itália, onde um dos amigos que viajaram comigo, tinha um pedaço da família em cada canto daquele país. Era sempre uma festa. Sempre muita comida e bebida pra receber o parente brasileiro. E eu, sempre na cola, aproveitando tudo. Foi a primeira vez que bebi vinho Lambrusco. E além de tudo, a alegria de ouvir uma língua latina, novamente.

Foi graças a essas viagens de trabalho que conheci Paris, Londres, Copenhague, Lisboa. Sempre aproveitando alguma brecha, pude visitar a Espanha, a Bélgica, a Áustria e a Holanda. Pude pisar no chão da Argentina, Venezuela, Canadá e Estados Unidos. Em alguns desses lugares tive alguns dias pra explorar. Em outros, apenas algumas horas. Em todos, sempre busquei experimentar algo novo, entender seus sabores.

Atualmente, as viagens que faço são muito mais curtas. E, muitas vezes, fico mais tempo dentro do avião do que no país pra onde estou indo.

É exatamente o que vai acontecer hoje. Viajo, daqui a pouco, pra Alemanha, pra participar de um evento com um dia e meio de duração. Vou num pé e volto noutro. Mas já sinto saudades.

quinta-feira, 25 de outubro de 2007

De volta pra casa

Fazia tempo que não enfrentava um atraso de vôo. Pois aqui estou eu, no aroporto de Confins, em Belo Horizonte, amargando uma espera de mais de 2 horas. Acabaram de informar mais uma previsão. Fiquei um dia em BH e dois em Vitória e estou louco pra voltar pra casa.

Acho Vitória uma das cidades mais agradáveis do Brasil, embora agradável não seja um adjetivo que excite muito. Mas não é assim que eu sinto. Vitória é uma cidade que me agrada e me excita. É que quando eu penso em Vitória, logo me vem à mente a sua moqueca, que difere da baiana por não ter leite de côco e nem dendê, o que a torna mais leve. Quem é do Espírito Santo diz que isso também a torna mais saborosa. Aí, já discordo. Como eu gosto das duas, não entro nesta briga. Mas a disputa existe. Tanto que eles têm até um lema: “Moqueca é a capixaba. O resto é peixada”. Pura provocação. (A foto da moqueca é de Humberto Capai/Usina de Imagem)

Minas sempre me ganha pela comida. É, provavelmente, a que eu mais gosto, entre as cozinhas regionais. E o que mais me seduz, nesta terra, é que, ao contrário da Bahia, Rio Grande do Sul ou Pernambuco, onde só se come vatapá, galeto ou carne de sol em restaurantes típicos, em Minas, pode-se comer feijão tropeiro, tutu ou frango com quiabo, em qualquer restaurante de esquina. E BH é a única cidade que eu conheço em que todos os botecos, à noite, ficam cheios de gente, seja sábado, seja segunda-feira. Qualquer dia! É lá que mais se cultua a comida de boteco, a baixa gastronomia, tão apreciada por quem gosta de um copo sujo, como eu. Fui conhecer o
Pinguim, a mais famosa choperia do interior paulista, o primeiro inaugurado fora de Ribeirão Preto. Me esbaldei.

O rádio do táxi que me levou da cidade ao aeroporto estava sintonizado numa daquelas estações que reservam grande parte de sua programação para falar de crimes e tragédias ocorridas na cidade. E no programa, além das notícias, pude ouvir depoimentos de pessoas humildes relatando os fatos ocorridos. Mortes por problemas de atendimento num hospital, atropelamentos por falta de controle do tráfego numa avenida, transtornos vários por conta de mal planejamento de alguma obra. Todos, problemas relacionados com a ineficiência do poder público, o que contrasta com a forte campanha de marketing do governo estadual, de Aécio Neves, o governador namorador. Fiquei intrigado. Será que essa gente não enxerga a relação destes problemas com a administração estadual? Será que o marketing governista mineiro, exportado até mesmo pra fora do estado, está cegando e anestesiando todo mundo?

Em meio a essas elucubrações fui surpreendido com um comentário do taxista que, até então, estivera calado. Após ouvir as repostagens, desembestou a fazer um discurso indignado contra o governo estadual, ressaltando o perfil marketeiro de Aécio Neves, o governador namorador. Um discurso parecido com o que eu estava pensando. Fiquei com mais esperança no mundo.

quarta-feira, 17 de outubro de 2007

Conversa pra filosofar

Desde que comecei o blog, sempre que vejo um filme, ouço um disco novo, faço uma viagem ou leio um livro, faço cada uma dessas coisas pensando em escrever. No decorrer da leitura do livro, por exemplo, fico pensando nas coisas que vou salientar, no que me tocou mais, no caminho que vou tomar no próximo post. Muitas vezes, aliás, o que escrevo nem tem tanto a ver com o filme, CD ou livro. Eles apenas servem de pano de fundo pra eu poder expressar aquilo que me dá vontade, naquele momento.

Inexplicavelmente, não sei bem o que escrever sobre Às Margens do Sena, uma espécie de biografia do jornalista Reali Jr., a partir de entrevistas e conversas com Giani Carta. Isso não quer dizer que o livro não seja bom. Muito pelo contrário. Acredito que minha dificuldade em escrever sobre ele deva-se, exatamente, pelo fato dele ter me absorvido toda a atenção enquanto eu o lia. A única coisa que eu pensava, lendo o livro é que, se eu fosse jornalista, gostaria de ter seguido os seus passos. Afinal, ele escreve, sobretudo, a respeito de política e futebol, dois assuntos dos quais eu mais gosto. Mais do que isso, sua carreira começou em São Paulo, mas, desde 1972, ele se mudou pra Paris com mulher, filhas e a coragem. Conheço muito pouco de Paris, mas, nos 2 dias e meio que passei lá, fiquei com uma profunda sensação de que não me sentiria muito deprimido se tivesse que morar naquela cidade. Além do mais, uma de suas filhas, a Cristiana Reali, além de bonita (as 4, na verdade, o são) é uma das atrizes mais respeitadas, atualmente, na França. E, pensando em tudo isso, percebi que o que eu sentia, mesmo, era uma ponta de inveja do Reali. Não uma inveja maléfica. Sentia um tipo de inveja do bem (se é que isso existe), pensando que até gostaria de ter a vida dele, mas consciente de que gosto muito da minha vida, não desejei, em nenhum momento, que ele não tivesse tido a sua.

O Reali é um tipo de jornalista das antigas. É do tempo que não era necessário fazer faculdade pra ser jornalista. Bastava trabalhar em jornal e ter qualidade. E aí, pensando nisso, percebi que a maioria dos jornalistas que eu mais admiro, não fizeram faculdade pra exercer essa profissão. Nenhum deles. Nem Clóvis Rossi, nem Carlos Heitor Cony, nem Juca Kfouri, nem Sérgio Cabral, nem José Trajano, nem Elio Gaspari, nem Luís Nassif. Mas não vou gastar este tempo e espaço pra ficar filosofando sobre o que eu acho da obrigatoriedade do diploma pra exercer a profissão. Tenho minha opinião, mas isso importa muito pouco. Além do mais, esse não é um assunto que me tira o sono.

O livro é delicioso. O papo flui rápido e fácil. Reali fala de jornalismo e, sobretudo, do seu trabalho como correspondente de rádio e jornal. Fala dos políticos franceses e dos exilados brasileiros na França, com quem ele conviveu na época da ditadura militar no Brasil. Fala de Celso Furtado, de Miguel Arraes, de Brizola. Fala de seu contato com FHC e com Lula. E fala, sobretudo, das viagens de férias que costuma fazer pelas cidades da Europa ao lado de Luís Fernando Veríssimo. Viagens gastronômicas, como as que eu gosto de fazer.

Aproveita a conversa para filosofar. Filosofar e ensinar. Ensina como é que um jornalista deve preservar suas fontes. Ensina como é que um jornalista de esquerda consegue trabalhar num órgão de direita (O Estado de São Paulo). Ensina, sobretudo, como viver uma vida plena de prazeres, conjugando trabalho e dedicação à família.

Agora que terminei de ler o livro, vou emprestá-lo pra Bá, minha querida sobrinha, que se forma este ano e será, sem dúvida nenhuma, uma ótima jornalista.

domingo, 14 de outubro de 2007

Programa triplo

Como já é de praxe, aproveitamos o fim de semana prolongado por um feriado para ir pra São Paulo, ontem. Fizemos um programa triplo, sem contar as habituais peripécias gastronômicas.

O primeiro filme que assistimos foi Piaf – Um hino ao amor, de Oliver Dahan, sobre a vida da cantora francesa Edith Piaf. Confesso que sei muito pouco sobre ela e, por isso mesmo, fiquei espantado com o que vi. Pelo que o filme mostra, sua vida foi um drama absoluto, do começo ao fim. Desde a mais tenra infância, passando pela adolescência, mesmo no auge, tudo, muito dramático. E o filme é assim, também. Chega a sufocar um pouco. Fiquei com a sensação de que a atriz que a interpreta (Marion Cotillard) teve uma atuação muito caricata, principalmente seus trejeitos e seu aspecto físico. Pesquisando um pouco, depois, percebi que a caracterização beirou a perfeição.

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Outra coisa muito bem feita foi a dublagem das cenas. Tanto assim, que saí do cinema convencido de que a atriz teria cantado nos números musicais. Depois, nas pesquisas, descobri que foram usadas, na maioria das cenas, gravações originais da própria Piaf e, nos casos em que isso não foi possível, a tarefa ficou a cargo da cantora francesa Jil Aigrot.



O ponto fraco do filme é a forma com que ele lida com a ordem cronológica. É sempre um grande desafio ficar brincando com duas épocas num filme. Poucos são aqueles em que isso é feito com sucesso. Em Piaf, as épocas são embaralhadas de tal forma, que tem-se a impressão de que o responsável pela montagem do filme não sabia o que estava fazendo. Isso não compromete a compreensão da história, mas causa algum desconforto. Enfim, saí do cinema na dúvida se tinha gostado do filme ou não. Depois das pesquisas, gosto mais dele hoje do que gostei ontem.

O segundo filme foi Propriedade Privada, de Joachim Lafosse, com a atriz Isabelle Huppert de A professora de piano e de 8 mulheres. É o típico filme
francês, bem paradão. Super paradão, pra dizer a verdade. O filme é tão lento que nos dá a chance de ficar refletindo sobre a vida e nisso reside sua maior virtude. Na relação entre uma mãe de meia idade e seus filhos pós-adolescentes, verifica-se, sobretudo, falta de amor. Aliás, percebe-se a inexistência de amor em todas as relações pessoais do filme. Isso, embora dê uma tristeza muito grande, faz pensar em quanta gente vive assim, sem estabelecer relações verdadeiramente amorosas. E, embora o filme trate, em seu ponto central, da discussão sobre a posse de uma casa, não é o interesse por dinheiro que causa essa falta de amor. É cansaço. Cansaço da vida. Lembra até uma letra de Antônio Maria: “Cansaço da vida, cansaço de mim, velhice chegando e eu chegando ao fim”. E o filme, realmente, cansa um pouco.

Pra terminar o dia com mais alegria, fomos ver o show da Teresa Cristina e Grupo Semente, no teatro da Fecap. Não poderia haver programa melhor. O show serviu pra lançar seu novo CD, Delicada, que eu tinha ganhado da Clélia no começo da semana. Ela desfilou músicas do disco novo e algumas outras coisas gravadas nos discos anteriores. Exibindo a sempre sincera simpatia, cantou com competência todo tipo de samba e até o que nem parecia samba, como a música Gema de Caetano Veloso. Resgatou um ponto de umbanda antigo e belíssimo de Ruy Mauriti, Nem Ouro nem Prata e no fim do show, na hora do bis, desfilou 3 músicas de carnaval, algo bem carioca. Cantou acompanhada do Grupo Semente e de Paulão 7 cordas, responsável também pela direção musical do show e do disco. E, como sempre acontece em seus shows, contou com uma canja de Pedro Miranda. E, como em todas as canjas de Pedro Miranda, ele cantou O samba é meu dom. Ainda bem!

sexta-feira, 12 de outubro de 2007

O som do Vinil

Assisti, ontem à noite, no canal TV Brasil, um trecho do programa O Som do Vinil, apresentado por Charles Gavin, baterista dos Titãs. O programa tem uma proposta pra lá de interessante. Escolhido um disco, ele é dissecado em cada uma das faixas, contada a história de cada música, através de entrevistas com cantores, compositores e músicos que participaram daquela gravação. É entrevistado, até mesmo, o artista que foi responsável pela capa. No programa de ontem, o disco escolhido foi o Clube da Esquina. E no programa, desfilaram depoimentos de toda a turma: Milton Nascimento, Lô Borges, Wagner Tiso, Fernando Brant, Márcio Borges e Toninho Horta entre muitos outros. Assisti o programa com muito prazer. Com prazer e nostalgia. Saudade de um tempo, eu pré adolescente, em que essas bolachonas pretas eram meus únicos objetos de desejo e destino de todo e qualquer dinheiro que caísse em minhas mãos.

O programa e o disco de ontem me fizeram pensar nos primeiros discos que fizeram minha cabeça:

Agora – Ivan Lins
Foi o primeiro disco que comprei. Eu tinha uns 11 ou 12 anos de idade. E durante um bom tempo, foi o único disco que eu tive. Mesmo depois que minha irmã, por descuido, deixou-o cair no chão da sala, quebrando-o e provocando uma cratera parecida com uma mordida, que comia a primeira faixa e a metade da segunda, de cada lado. Embora triste, não deixei de ouvi-lo, sempre a partir do meio da segunda faixa de cada lado. Era uma época em que eu estava vidrado num programa de TV chamado Som Livre Exportação, onde um bando de jovens desconhecidos como Ivan Lins, Gonzaguinha e Aldir Blanc, produziam um som absolutamente revolucionário, pra mim. Fui gostando, com o passar do tempo, cada vez menos de Ivan Lins. Muitos anos depois, quando este disco saiu em CD, comprei-o excitado. Não achei quase nenhuma graça.


1962-1966 e 1967-1970 - The Beatles
Com estes dois álbuns duplos, duas coletâneas, tive meu primeiro contato com os Beatles, por quem ficaria fanático e de quem nunca tinha ouvido falar antes do grupo terminar. O mais engraçado é que fui me interessar pelos Beatles apenas depois de ter conhecido o som de John Lennon.


Imagine - John Lennon
Não estou bem certo, mas acho que foi o segundo disco que comprei. Usei o dinheiro que ganhei no dia da criança. Foi difícil convencer meu pai a me dar dinheiro, ao invés de um brinquedo, como presente. Além do disco, cujas faixas eu ouvia como um viciado, eu era fissurado por um enorme pôster que acompanhava o encarte, com John Lennon, todo de preto, tocando um piano branco, numa sala branca. Muitos discos, nesta época, vinham com pôsters excelentes. Excelentes e grandes, coisa impensável na era do CD.


Goat's Head Soup – The Rolling Stones
Meu interesse pelos Beatles nunca provocou minha curiosidade pelos Stones. Deles, só tive dois discos e só este tocou mais em minha vitrola, sobretudo a faixa Angie. Sempre fiquei com a sensação de que explorei pouco os discos deste grupo. Mas, a falta de curiosidade naquela época, foi, pouco a pouco, e sempre, aumentando.



To whom it may concern – Bee Gees
Com essa idade, o que rolava na rádio que eu ouvia era mesmo a Música Pop americana. E entre os muitos grupos que eu gostava de ouvir estavam os Bee Gees. Gostava dos arranjos vocais. Durou pouco esta fase. Quando eu comecei a descobrir a MPB fui me desinteressando por eles e a sua guinada na direção do som da discoteca sepultou de vez meu interesse.


Caetano e Chico – Juntos e ao vivo
Foi o primeiro disco de MPB que me fez vibrar. Foi através dele que eu descobri o que acontecia no país. A ditadura, a resistência. Foi gravado num momento muito tenso do regime militar. Cheio de cortes e remendos, obra da censura.





Clube da esquina – Milton Nascimento e Lô Borges
Foi o disco que me mostrou que havia uma música muito moderna e diferente sendo produzida no Brasil. Não era samba, não era bossa nova, não era pop e era tudo isso ao mesmo tempo. Arranjos magníficos. Muita inventividade, muita coragem. O disco cheirava liberdade criativa.

Falso Brilhante – Elis Regina
A importância deste disco, pra mim, está ligada ao show de mesmo nome. Foi o primeiro que eu fui e o que me causou mais impacto, entre todos que eu vi. Era a primeira vez que eu entrava num teatro e a primeira vez que prestava atenção em Elis Regina. Depois disso, nunca mais tirei os olhos (e os ouvidos) dela.


Refavela – Gilberto Gil
Outro disco ligado a um show inesquecível. Foi em São Bernardo, uma fila imensa, com Gil chegando super atrasado. Pra compensar, ele fez um show que não terminava nunca. Fui embora antes do fim. Tinha que tomar o último ônibus. Foi este disco que me despertou para o som da áfrica e abriu meus ouvidos para o Reagee.


Moleque – Gonzaguinha
Provavelmente, o último disco de Gonzaguinha que eu gostei e o primeiro que comprei. Todos os anteriores são muito bons, mas só fui comprar muito depois, já no formato de CD. O discos que vieram posteriormente, foram piorando e, mesmo assim, comprei muitos deles. Foram piorando aos poucos, até chegar naquela babação de explode coração. Aí, tive que parar.





Comecei a escrever este texto sem ter em mente sobre quais discos falaria. Eles foram pintando na minha memória naturalmente. Só agora percebo que é uma insanidade tentar fazer alguma lista. Se eu ficar mais um tempo pensando, surgirão outros dez, outros cem, outros mil discos que fizeram e ainda fazem a minha cabeça. Só agora, escrevendo este parágrafo, me lembrei de João Gilberto, MPB4, Paulinho da Viola, Maria Bethânia e tantos outros que produziram discos que me deixaram em outra órbita. Tenho saudades do vinil.

terça-feira, 9 de outubro de 2007

Especialidades gaúchas

Nova passagem rápida por Porto Alegre, resolvi não comer pizza, pra não ter que me deparar com o catchup e nem escrever novamente sobre isso, ofendendo as susceptibilidades gaúchas. E, sendo assim, acabei optando pelo mais tradicional. Galeto, num dia e churrasco, no outro.

Numa galeteria, o critério é te entupir de comida, até você dizer chega. É a mesma estratégia que qualquer família, na Itália, utiliza, para agradar um visitante, ilustre ou não. Eu, a sinceridade obriga-me a confessar, sinto-me extremamente agradado com esta estratégia. As melhores galeterias em que eu já fui ficam em Caxias do Sul, mas em Porto Alegre e São Leopoldo, há boas também.

O processo começa com uma saladinha básica, almeirão e batata. Depois, vem uma infinidade de entradas, um festival de delícias: queijo, pão, salame, lingüiça, polenta, pastéis, entre outras coisas. A seguir, servem uma fumegante sopa de capeletti que eu, particularmente, adoro. Nunca deixo de tomá-la quando vou a Porto Alegre, seja inverno ou verão. E aí, quando você já está absolutamente empanturrado, começa o serviço, propriamente dito. Espaguete, rondeli, canelone, costela de porco e, é claro, o galeto. O galeto é um franguinho minúsculo que aos amantes dos animais daria dó vê-lo assado na travessa. Eu sou um grande amante dos animais. Amo tanto os animais que chego ao ponto de comê-los. Cozidos, assados, fritos e até mesmo crus. E, ao contrário dos seres humanos, que não amo tanto, eu como os animais qualquer que seja o sexo.

O problema neste tipo de refeição é que, pelo menos no meu caso, só se pára de comer muito depois de quando se deveria ter parado. Vale a pena. A gente sai do restaurante inchado, mas com uma expressão besta de felicidade no rosto.

Comer churrasco em Porto Alegre não deveria ser diferente do que comer churrasco em São Paulo. Afinal, todas as boas churrascarias daqui e também as medianas, são pilotadas por gaúchos. Aliás, o gaúcho é o único povo que sabe fazer churrasco, no Brasil. Ainda bem que tem tanto gaúcho em São Paulo, o que faz com que tenhamos mais churrascarias que Porto Alegre.

Deveria ser a mesma coisa, mas não é. Há as churrascarias gaúchas paulistas e as churrascarias gaúchas gaúchas. E as gaúchas são melhores. E eu me lembro, quando ainda era bem jovem, de um tempo em que as churrascarias daqui eram como são, hoje, as de lá. Acho que o gosto dos paulistas exerceu uma influência maléfica sobre os proprietários e, hoje, cada vez mais, estão inventando umas viadagens nas daqui, servindo todo tipo de coisa, como sushi, sashimi, camarão e até macarronada. Nada a ver.

Além do mais, aqui em São Paulo, há um hábito de servir a picanha em fatias bem fininhas, como se fosse churrasco de carpaccio. Em Porto Alegre, sempre posso comer grandes nacos de carne, bem vermelhas, sangrando. Do jeito que eu gosto.

Fui e voltei. Fiquei menos tempo que da última vez. Fui no tradicional. E me dei bem.

domingo, 7 de outubro de 2007

Tropa d(a) Elite

Eu e a Clélia, quando morávamos em São Paulo, sempre tivemos o hábito de pegar sessão dupla no cinema. Chegamos a experimentar sessão tripla, mas é muito cansativo. Além do mais, o cinema nunca é o mesmo sem a tradicional pizza depois do filme. O segredo da sessão dupla é diversificar os tipos de filmes. Evitar assistir dois filmes pesadões é sempre uma boa medida. Há muito tempo não fazíamos isso e ontem resolvemos voltar à velha forma. A Cecília foi com a gente.

Depois de assistir ao leve e delicioso filme O Homem que desafiou o diabo, fomos encarar Tropa de Elite de José Padilha.



Antes de qualquer coisa, devo dizer que o filme, como obra cinematográfica, tem boa qualidade. Tem uma dinâmica ágil, fotografia correta e prende a nossa atenção o tempo todo. A maioria dos atores não tem grande expressão, mas isso evidencia, ainda mais, o talento do protagonista, o excelente ator Wagner Moura, sem dúvida, um dos melhores surgidos nos últimos tempos.

Mas a questão estética e até mesmo a artística é o que menos importa neste filme. Importante mesmo são as reflexões que ele suscita na sociedade. E, neste sentido, o filme tem algumas virtudes e alguns pecados.

A principal virtude é a de fazer uma radiografia na estrutura da polícia militar. Mostrar que a corrupção naquela corporação é o principal motivo para que a violência seja um dos maiores problemas no nosso país. Sim, porque, apesar da história se passar na cidade do Rio de Janeiro, a corrupção que se verifica lá é a mesma em qualquer grande cidade brasileira.

O filme não poupa ninguém. Além de desmascarar a corrupção policial, toma o cuidado de não retratar os traficantes como pobres vítimas de um sistema cruel e selvagem. Sim, nosso sistema é cruel e selvagem e os traficantes colaboram pra isso. E não poupa a classe média, seja quando está engajada em algum programa social numa ONG qualquer, seja quando está consumindo as drogas que alimentam o tráfico.

O eixo central do filme é o retrato de um batalhão especial da polícia, o BOPE, do qual, um dos oficiais assume a narrativa em primeira pessoa. Com isso, humaniza a corporação, o que é até bom, mas esquece-se de humanizar as outras protagonistas da história, como a PM, os traficantes, a classe média, e reside aí, um de seus pecados, já que estes são retratados de forma maniqueísta. Mas o filme, a meu ver, não trata os soldados do BOPE como heróis. E é essa a confusão que está se fazendo a seu respeito. O fato de uma narrativa ser feita na primeira pessoa não significa, necessariamente, que esta seja a posição de seu diretor. Quem está fazendo isto é uma parcela da sociedade. Isto sim é que é grave. E está heroificando este batalhão, baseada num discurso de que nele, não há policiais corruptos, todos são honestos. Mas nesta história não há heróis. Não há para quem torcer.

Antes de qualquer coisa, eu não acredito que haja uma corporação da polícia que esteja imune a ser corrompida, mas, mesmo que isso fosse verdade, o fato de não corromper-se não é suficiente para arrogar-se de honesto. E é isto que o filme, talvez até sem querer, acaba mostrando em relação ao BOPE. Nele, nenhum dos policiais do batalhão é corrupto, mas todos praticam a tortura para obter confissões, todos participam, ou são coniventes com execuções sumárias de bandidos, mesmo que estes já estejam dominados. Estes policiais, no filme, acreditam que agir fora da lei é justificável para combater o crime. Mas não é.

O crime tem de ser combatido com repressão. Não há outra maneira. Mas deve ser reprimido de acordo com a lei. Quando um policial age fora da lei para reprimir uma ação criminosa, ele iguala-se ao criminoso e até o justifica. E quando o filme mostra a ilegalidade na ação do BOPE, acaba desmascarando sua atuação, derrubando o discurso do narrador da história e abrindo caminho para destruir sua heroicidade.

E é aí que a coisa adquire o aspecto mais perigoso. É que uma boa parcela da sociedade não desabona este comportamento desta polícia. São pessoas que embarcam num discurso simplista e aplaudem ações como esta, mesmo que baseadas na ilegalidade. E a oportunidade que o filme dá pra que esta reação aconteça é, possivelmente, seu maior pecado. Sim, pois o filme é muito simplista, o que acaba fechando a porta para outras reflexões, outras conclusões. Uma delas, sempre desprezada quando se fala em tráfico, é discutir quem é, realmente, que ganha o grosso do dinheiro com este negócio. Sim, porque o negócio é milionário e é muita ingenuidade pensar que sejam os chefes dos morros, aqueles que ganham mais dinheiro com ele. Não. Os verdadeiros chefes deste negócio não moram em barracos. Devem morar na zona sul ou na Barra da Tijuca.

Apesar de tudo, o filme deve ser visto pelo maior número de pessoas possível. É bom que seja. Mas é bom que as pessoas tentem tirar suas próprias conclusões. Se for pra receber a conclusão concebida por outro, se querem que a coisa venha já mastigada, então é melhor que economizem seu dinheiro e fiquem em casa assistindo o Fantástico.

sábado, 6 de outubro de 2007

Bom divertimento

Nunca achei muita graça no ator Marcos Palmeira. E antes que alguma das raras leitoras deste blog me interpele, vou logo reconhecendo: Ele é muito bonito. OK, mas um ator não deveria depender só disso. Minha má vontade com ele começou a diminuir quando assisti alguns episódios do seriado Mandrake, baseado num personagem de Rubem Fonseca e produzido pelo canal de TV paga HBO. E a minha cisma esvaiu-se toda com o filme O Homem que desafiou o diabo, de Moacyr Góes.

Trata-se de uma fábula em que o protagonista percebe que a única maneira de empreender uma busca pela liberdade é enfrentar todos os medos que temos na vida. E assim, sem medo de nada, sai em busca de uma terra onde nos rios corre leite e as montanhas são de rapadura. Mete-se em intermináveis encrencas, enfrentando valentões sertão adentro e namorando muitas mulheres por onde passa.

É um filme despretensioso, mas divertido. Tem um ritmo ágil, uma fotografia competente, muito humor e sensualidade. Um dos pontos de qualidade é a trilha sonora, com a assinatura de Gilberto Gil nas canções. O ponto alto do filme, entretanto, é o ator Leon Góes que, além de esplêndida atuação, trabalhou na preparação dos atores. Fez um trabalho brilhante, já que todos exibiam um sotaque nordestino absolutamente autêntico.


E como se não bastasse tudo isso, há no filme a deliciosa presença de Fernanda Paes Leme. Quase não falou. E nem precisava.

Lembrança, ainda

Desde que houve o acidente com o avião da Tam eu só viajei utilizando o aeroporto de Cumbica, em Guarulhos ou Viracopos, em Campinas.

Ontem, vindo de Joinville, com a tarde caindo e o tempo bem nublado, fechado mesmo, desci em Congonhas. Impossível não lembrar de 17 de julho.

Segunda-feira, viajo pra Porto Alegre. Vou por Viracopos.


domingo, 30 de setembro de 2007

Blogueando

Uma das coisas interessantes que a blogosfera nos oferece é a possibilidade de ficar passeando por ela e garimpando novas informações. Passear pelos blogs é descobrir novas pessoas, conhecer novos pontos de vista, argumentar, discutir, brigar até. Isso enriquece. Qualquer diversidade enriquece.

E foi num destes passeios que eu descobri o blog A vida em palavras da baiana Alena Cairo. Um blog com muito tempero, como toda a Bahia.

E foi no blog da Alena que eu descobri o site Apenas Bahia, Apenas Fotografia do também baiano Adenor Gondim. Vou deixar que ele mesmo se apresente:

"Meu nome é Adenor Gondim, sou Brasileiro, Baiano, nasci em Rui Barbosa, estou vivo há 54 anos, há pelo menos uns 30, tento ser fotógrafo, por não estar preocupado em quantos tenho pela frente, vou tentar através desta coisa chamada blog (Apenas Bahia. Apenas Fotografia) compartilhar com você o meu jeito de ver e sentir o povo e as coisas dessa terra chamada BAHIA."


Enfim, é um blog pra alegrar os olhos de todos aqueles que gostam da Bahia. E pra aqueles que não a conhecem, começarem a gostar.

sexta-feira, 28 de setembro de 2007

Cinema e Literatura

Gosto dos filmes de Fernando Meirelles. Gostei de Domésticas, tanto que até escrevi um texto sobre ele num outro site quando o vi no cinema. O texto sumiu da Net. Gostei de Cidade de Deus, apesar de sua dinâmica padrão global. E gostei de O Jardineiro Fiel, apesar de não gostar do ator Ralph Fiennes. Nos filmes de Meirelles me agrada, justamente, não conseguir reconhecer um estilo de dirigir, uma assinatura. Por isso, acredito que ele seja um dos diretores mais versáteis e criativos da atualidade.

Gosto muito de José Saramago. Gosto de seu estilo e de sua verve. Não li todos os seus livros, mas aqueles que li me agradaram muito. O primeiro foi O Evangelho segundo Jesus Cristo. Ateu como eu, Saramago se arvorou no direito de escrever um evangelho e o fez com uma visão mais humana de Cristo. Por ser o primeiro livro dele que eu lia, custou-me um pouco (bem pouco) acostumar-me com seu estilo desprovido de pontuação. Quando se pega o jeito, qualquer livro seu vira um vício. O que eu mais gosto, de longe, é Ensaio sobre a Cegueira.

E foi por isso mesmo que eu exultei quando soube que Fernando Meirelles iria filmar o Ensaio sobre a cegueira. Mais ainda quando soube que a atriz principal seria Julianne Moore, uma das que mais gosto. O filme será rodado em Toronto, Montevidéu e São Paulo. Aliás, o filme já começou a ser feito e descobri esta semana que é possível acompanhar os detalhes da filmagem. É que Meirelles resolveu fazer um blog relatando o que ocorre no set de filmagem. Para aqueles que gostam de assistir aos extras quando aluga um DVD, poderá ser uma experiência interessante, acompanhar as peripécias dos atores, técnicos e diretor, antes de ver o filme. Tenho certeza que, pelo menos no meu caso, isso só vai aguçar a vontade de vê-lo logo na tela.

quinta-feira, 27 de setembro de 2007

Sonhando

Eu quase nunca sonho. Muito raramente. Ou, se sonho, nunca me lembro. A Clélia sonha sempre. Todos os dias. Lembra-se de detalhes e até controla o sonho. Até voa, quando decide.

Eu tenho, entretanto, dois sonhos recorrentes que, aliás, faz tempo que não me assaltam. Um angustiante e outro delicioso.

Sonho que estou nu, dentro de casa, muito tranqüilamente e de repente, por algum motivo eu me vejo trancado pra fora. E assim, nu e exposto a tudo e a todos, inicio uma angustiante corrida pra me esconder e esconder minhas vergonhas. Procuro por todo lado e não consigo encontrar abrigo. Não encontro nunca. O mais intrigante é que, no sonho, ninguém parece se importar com isso. Só mesmo eu sou acometido desta angústia insuportável.


Sonho que estou sozinho numa festa, cheia de gente. Cheia de gente desconhecida. E, de repente, chega à festa, também sozinha, uma mulher maravilhosa. A mulher mais linda que eu já pude ver na vida. E, assim que entra, ela, de longe, olha pra mim e me dirige um sorriso convidativo. Um sorriso oferecido. Um sorriso sobre o qual não pode restar a menor dúvida. E eu passo o sonho todo tentando entender por que é que aquela mulher tão linda, tão maravilhosa, escolheu justamente a mim, entre tantas pessoas, sem que eu tivesse, ao menos, proferido uma só palavra, feito um só gesto. Fico tão intrigado e interessado em entender seus motivos, que não aproveito a oportunidade que o sonho me dá.

Ídolos

Ontem faleceu Roberto Dias. Talvez tenha sido o meu primeiro ídolo. Final dos anos 60, eu não tinha nem dez anos ainda. Descobria-me são-paulino e me encantava ouvir no rádio as partidas em que um São Paulo sofrível conseguia enfrentar o Santos de Pelé e resistir graças a este zagueiro. Mais tarde, nunca mais tive ídolos. O último foi, por certo, Pedro Rocha, que me emocionou, já adolescente. Depois disso, nunca mais. Nem no futebol, nem na música, nem na política. Admirar sim. Idolatrar nunca mais.

O São Paulo venceu o Boca Juniors com a braçadeira do luto. Homenagem a Roberto Dias. Jogador de um tempo em que zagueiros e volantes sabiam jogar futebol.