Livros, música, cinema, política, comida boa. Isso tudo e mais um montão de tranqueiras dentro de um baú aberto.

sábado, 25 de abril de 2015

Safadeza divertida

Quem vê a capa e olha o título do livro O cheirinho do amor –Crônicas safadas, logo imagina que se trata de uma coletânea de histórias de sacanagem. E é isso mesmo. Mas não é só isso. Embora, em cada texto, o escritor Reinaldo Moraes destile toda sorte de histórias em que o sexo é protagonista, não se furta a inserir estes relatos nos cenários mais variados possíveis. Desta maneira, as tais crônicas exibem sua safadeza envoltas em ambientes ligados ao cinema, teatro e literatura, além do jornalismo, entre outros. Assim, o escritor empresta um ar de seriedade aos textos, sem, entretanto, perder o estilo sacana de escrever. Com isso, demonstra que é possível ser sério e divertido ao mesmo tempo.

Reinaldo abusa de trocadilhos, dos mais criativos aos mais infames (estes, os melhores), mostrando sempre o quanto o sexo comanda o estilo deste escritor sexagenário (com o perdão do trocadilho, também infame, de minha parte). O vocabulário que utiliza não tem frescura e não se percebe uma preocupação em ser politicamente correto, como, tampouco, há a preocupação com o inverso. É um vocabulário de quem não aprendeu sobre a vida mundana em aulas de educação sexual no colégio, mas sim, na rua, como era praxe para uma geração em que o máximo que havia como suporte teórico para este aprendizado eram os catecismos de Carlos Zéfiro.

Para fazer um resumo sobre tudo isso, nada melhor que reproduzir o que Matthew Shirts escreveu na orelha do livro: “Se você gosta de sexo – do tema, ao menos – e de uma boa história, vai se deliciar com este livro”. Concordo e dou fé.

sábado, 18 de abril de 2015

Motivações do impedimento

A corrupção é um tema muito sério, ninguém duvida disso, mas tenho insistido que esta é apenas uma parte da reflexão que a sociedade tem que exercitar. Além do mais, este mote é antigo e já foi parte da estratégia política em diversos momentos de nossa história. Carlos Lacerda fez isso desde os anos 40 e a receita era simples e batida: foque as denúncias numa só uma direção, em apenas um partido ou determinado político, como se este ou aquele, fosse o inventor da corrupção no Brasil. Lacerda fez isso com Getúlio, com Juscelino, com Jango. Nunca conseguiu se eleger. Outros, entretanto, conseguiram, utilizando o discurso de limpeza, como Jânio e sua vassourinha e Collor com a fama de caçador de marajás. Em ambos os casos, vimos no que deu.

O que temos agora, é uma tentativa insistente, capitaneada pelo PSDB, de passar para a sociedade a ideia do impeachment. Foi a estratégia escolhida pelos tucanos. Para isso, conta com a poderosa ajuda da grande mídia.

Me pus, então, a refletir sobre qual é a verdadeira razão dos tucanos insistirem tão tresloucadamente nesta estratégia. A resposta é clara: eles não têm voto. Não tiveram em 2014 e não terão em 2018.

Muita gente pode imaginar que eles quase chegaram lá, que no 2° turno, apenas 3,46 milhões de votos deixaram Aécio distante de Dilma, mas o raciocínio é um pouco menos simplista. Se nos lembrarmos do 1° turno, veremos que enquanto Dilma teve 41,5% dos votos, Aécio teve 33,5%, ou seja, uma diferença de quase 9 milhões. No segundo turno, a majoração deveu-se muito mais ao antipetismo do que a uma preferência pela penugem tucana. Só continuou na disputa porque o PT, durante a campanha, decidiu concentrar em Marina Silva sua artilharia, ou seja, concluiu que seria mais difícil vencer a candidata acriana do que o mineiro.

Além do mais, devemos atentar ao fato de que o voto em Aécio, no 2° turno, foi extremamente multifacetado, indo desde a parcela da classe média descontente com os rumos do governo petista, até os radicais de direita que defendem a volta do regime militar, passando pelos homofóbicos, pelos racistas e outros exemplares desta diversa fauna que compareceu às manifestações de 15 de março. A percepção de que esta mistura é muito heterogênea, aliás, foi o que motivou o fracasso das manifestações de 12 de abril, quando a maioria da classe média ficou em casa, preferindo não se misturar com os radicais (no que fez muito bem).

Agora, vamos brincar de futurologia. Se Dilma continua no poder, com o PT bastante desgastado durante os próximos 3 anos, mesmo que Lula saia candidato, dificilmente conseguirá, no primeiro turno, mais do que os 30% de votos que tradicionalmente o partido tem. Podemos contar que Marina (se conseguir registrar seu partido) estará, novamente, na disputa e deve manter os 20 milhões de votos que conseguiu em 2014 e 2010. O PMDB deve lançar candidato próprio, possivelmente Eduardo Cunha, o que garante um grande contingente do eleitorado conservador (sobretudo os evangélicos). Além disso, tem Bolsonaro, que já declarou que sai candidato (embora não tenha partido, ainda), e que deve aglutinar a preferência dos radicais de direita, saudosos dos tempos em que a caserna é que mandava no Brasil. Por fim, o PSOL, que teve quase 2% de votos em Luciana Genro, deve crescer um pouco mais, principalmente se apresentar um candidato com propostas mais consistentes. Aí, basta fazer as contas. O que sobra para o PSDB é muito pouco.

Os tucanos sabem disso. Eles são profissionais da política e fazem contas. É um partido que tem caciques muito experientes (o que falta é índio), mas com grande dificuldade de seduzir as massas, já o disse, publicamente, Fernando Henrique. Além do mais, como se não bastasse o desgaste que a disputa interna entre Alckmin e Aécio deve gerar, qualquer uma das soluções deve levar José Serra para outro partido, provavelmente o novo PSD de Gilberto Kassab.

A saída do impeachment, portanto, foi a estratégia escolhida. Levaria o PMDB ao poder (seja com Michel Temer, seja com Eduardo Cunha), que ficaria desgastado nestes 3 próximos anos de governo e, com isso, os tucanos teriam alguma chance de ir para o segundo turno.

Taí: agora ficou mais fácil entender esta renitente insistência no impedimento da presidente do Brasil. Puro desespero de causa.


sábado, 11 de abril de 2015

Selvageria

É bastante comum utilizarmos os termos humano ou humanitário de forma positiva. Da mesma maneira, quando classificamos alguém como desumano, estamos quase sempre indicando uma atitude horrível. Credito este fenômeno a certa condescendência exagerada com nossa espécie. É como uma puxada de brasa coletiva pra nossa sardinha.

Se pensarmos bem (ah! como é difícil pensar com isenção), ao mesmo tempo em que salientamos a capacidade que o homem tem de ser solidário, carinhoso, altruísta e generoso, deveríamos também reconhecer que, dentre os seres de todo o reino animal, talvez sejamos o único exemplo capaz de escravizar, torturar e ser cruel com outro da mesma espécie. Muitos animais utilizam a violência como forma de sobrevivência. Para conseguir seu alimento, garantir seu espaço, perpetuar a espécie, diversos exemplares da fauna terrestre são capazes de trucidar sua presa, mas nunca veremos um leão matar um veado e abandonar a carne e nem uma gaivota tirar um peixe do mar só para fazê-lo sofrer. Podemos dizer que, se fizessem isso, estes animais estariam tendo atitudes humanas.

Entre os sentimentos exclusivos dos humanos podemos citar a inveja e o ódio. Entre as atitudes que somos capazes de tomar, talvez a mais vil seja a vingança. Sim, por que a vingança é a maldade praticada apenas pelo fato de termos sido, também, vítimas. É a vingança que faz com que legitimemos nosso algoz, dando a ele a justificativa para ter sido cruel conosco, ao mostrarmos que somos capazes de ser como ele é, muito mais do que somos capazes de perdoar.

E é justamente sobre a vingança que trata o ótimo filme Relatos Selvagens. Produção conjunta entre Argentina e Espanha, o filme é ágil e perspicaz. São 6 histórias muito rápidas que prendem a atenção do espectador durante todo o tempo e, apesar do tema ácido e também da violência das cenas, é um filme muito engraçado. Como se isso não bastasse, tem Ricardo Darín em seu elenco, sem dúvida nenhuma o melhor ator latino-americano dos dias atuais.

Nenhuma das histórias é ruim, o que vai fazer com que cada um que assistir ao filme tenha a sua preferida. Dirigido pelo argentino Damián Szifron, criador da excelente série Los Simuladores, de 2002 que, lamentavelmente fez pouco sucesso quando exibida no Brasil, o filme mostra como o cinema argentino está mais evoluído do que o brasileiro, na atualidade.

É duro reconhecer, mas além da superioridade da carne e do futebol, temos que engolir o fato de que o cinema dos hermanos é muito mais instigante do que o nosso. Isso dá uma certa raiva, motivada por alguma inveja. Dois sentimentos absolutamente humanos.