Livros, música, cinema, política, comida boa. Isso tudo e mais um montão de tranqueiras dentro de um baú aberto.

sexta-feira, 28 de fevereiro de 2014

Oscar 2014

Já expliquei, aqui, num outro post, que não dou muita bola para o Oscar, que valorizo mais o Globo de Ouro e, mais ainda, o Festival de Berlim, mas, todo ano, acabo dando, se não alguma atenção, ao menos uma espiadinha na lista dos filmes indicados. Este ano, só fui dar uma olhada nesta lista hoje e descobri que, dos 9 selecionados, só assisti a 4 deles.
O Lobo de Wall Street, do Scorsese, foi um dos que mais gostei. Andei lendo algumas críticas que o apontavam como um filme que estimulava ou, ao menos, contemporizava com a busca do sucesso através de falcatruas. Achei que não. O filme mostra um retrato fiel da sociedade americana, sua habitual ânsia de enriquecer e, se os trapaceiros do filme utilizam meios criminosos para ludibriar os clientes, as vítmas também exibem uma ambição desmesurada de alcançar seus intentos, oferecendo aos vilões um terreno fértil para executar as trapaças.
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Outra acusação que andei lendo sobre o filme foi o excesso de cenas com drogas e sexo. Prefiro muito mais isso do que quando excedem em cenas de violência. Se não dá pra escapar dos excessos, prefiro ver bundas e genitálias do que ver sangue. O ponto de destaque, no filme, é a atuação de Leonardo DiCaprio, cada vez um ator mais maduro, apesar de seu eterno ar jovial e sua extrema beleza. Mas isso não é culpa dele. Fazer o que? A natureza foi generosa, no caso.
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Philomena, de Stephen Frears, foi outro filme do qual gostei bastante. Uma dura crítica aos desmandos da igreja católica, na Irlanda, um dos países em que o catolicismo é o mais radical no mundo. Sempre me incomodou, aliás, a forma com que a mídia ocidental é condescendente com este radicalismo. Basta notar o fato de que, ao se referir a terroristas do Hamas, utilizam sempre o termo “radicais islâmicos”. Nunca vi, entretanto, uma referência aos terroristas do IRA como “radicais católicos”. No filme, a igreja usa a religiosidade das pessoas para reforçar seu poder e justificar atrocidades, em nome de um moralismo que não está tão distante dos dias de hoje, pois não trata da época da inquisição, mas de apenas 50 anos atrás. Judi Dench, que concorre ao prêmio de melhor atriz, está absoluta no papel. Seria minha favorita, mas parece que Cate Blanchett é mais cotada por sua atuação em Blue Jasmine de Woody Allen.
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Embora seja um filme sobre a escravidão nos Estados Unidos, a religião também é o pano de fundo de 12 Anos de Escravidão, de Steve McQueen. É a religião que serve de justificativa para os algozes subjugarem seus semelhantes de pele negra, através de interpretações oportunistas da Bíblia e é, também, a religião, e principalmente a esperança de redenção, que serve de ferramenta aos escravos para suportar os castigos. Por mais que seja sempre necessário mostrar o que o homem é capaz de fazer quando trata de ser cruel com um semelhante, achei que o filme exagerou na exibição das chagas abertas pelos açoites dos chicotes.
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A mensagem mais marcante do filme, para mim, foi a de quanto é possível reduzir o ser humano à sua condição de animal quando alguém o escraviza, tirando dele tudo o que, de positivo, é capaz de sentir, quebrando o seu espírito de solidariedade. O ponto alto do filme, além da excelente atuação do ator inglês Chiwetel Ejiofor, é sua ótima fotografia com uma infinidade de belíssimos planos com baixa profundidade de campo. Fiquei muito surpreso ao notar que ele não está na lista dos concorrentes ao prêmio de melhor fotografia.
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O filme do qual eu menos gostei foi Trapaça, de David Russell. Achei o filme mal feito, esta é a verdade. Não gostei da atuação dos atores e nem mesmo a presença de Amy Adams, que eu acho uma delicinha, salva o filme, já que ela não convence no papel de femme fatale. Ela é uma gracinha, reconheço, mas lhe falta o sex appeal que o papel demanda. Embora eu admita que a produção de Hollywood não é aquilo que mais me empolga em se tratando de cinema, fica difícil acreditar que não houvesse, ao longo de todo um ano, algum filme melhor que este para figurar na lista de indicados. É por estas e outras que se explica o meu desdém pelo Oscar.

terça-feira, 25 de fevereiro de 2014

Objeto de desejo

O consumismo é, talvez, uma das maiores pragas que assolam a nossa sociedade. Possivelmente sempre tenha sido assim, mas, o que sinto, ultimamente, é um exagero neste comportamento que, por sua vez, alimenta e incentiva uma qualidade, esta sim, uma das piores que carregamos, intrinsecamente, que é a vaidade. Vaidade aliada ao consumismo resulta em ostentação que, numa análise rasa, presta-se à tarefa de se mostrar melhor que os outros aos olhos de todos. É o carro de luxo ou as roupas de grifes caras, nos dias de hoje, mas já foi a exibição de jóias raras num passado recente ou, mesmo, mais antigamente, passear num domingo, no centro de uma grande cidade, ladeado por muitos escravos.
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Outra faceta do consumismo é o descontrole que, às vezes, ele acarreta. Isso acontece com todo mundo, mesmo com quem não admita. Eu digo isso por mim, que não ligo pra carro, pra roupas e sapatos, que nem uso relógio e não me encanto com parafernálias tecnológicas. Eu, que não me empolgo com a moda e nem com a aparência, tenho, também, o meu fraco que são os livros.

Compro-os aos montes e me assusta, diariamente, sempre que olho pras minhas estantes, a certeza de que não vou conseguir lê-los todos, antes do fim da vida, mesmo atualmente, quando estou lendo de maneira compulsiva. Essa certeza, porém, não é capaz de fazer-me parar de comprá-los, ainda mais agora que se pode fazer isso sem gastar tanto dinheiro através das lojas virtuais. O site Buscapé é um garnde perigo, pois sempre dá pra encontrar um negócio irresistível numa destas livrarias.

Pois foi justamente isso que aconteceu com o livro João Gilberto, reunião de textos diversos organizados por Walter Garcia e editados pela Cosac Naify. O fato do livro ter saído por esta editora já é um sinal de que o objeto do desejo será caro. A Cosac Naify é a Louis Vuitton das publicações.
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Eu vinha namorando este livro há tempos, sempre folheando suas páginas com cuidado, como quem acaricia uma mulher linda e frágil, para preservar sua integridade. Já me peguei enamorado com ele nos corredores da Livraria da Vila, nas potronas da Livraria Cultura e até na FNAC, aquela livraria que virou loja de eletrodomésticos. Em todas elas, porém, o valor superior a 200 reais sempre me demoveu de comprá-lo. Pode parecer pouco dinheiro pra quem acha natural pagar mais de 150 mil reais por um carro ou mais de 500 reais por um par de tênis, mas, para aqueles que, como eu, têm como objeto de desejo os livros, este valor é uma fortuna. Até que um dia, nos meus passeios pelos sites das lojas, encontrei-o pela metade do preço. Não foi na semana da black Fryday, mas foi próximo. Não titubeei e agora que o tenho ao alcance das minhas mãos, miro-o com todo zelo, hesitante em tocá-lo, para não macular sua virgindade.