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sábado, 3 de outubro de 2015

Sentir, mais que entender

Certa vez comentei com um amigo que era impossível viver com uma mulher que não gostasse de João Gilberto. Nem me lembro se ele concordou comigo, mas isso pouco importa. O que importa é que eu realmente acreditava nisso naquela época e, talvez, ainda acredite hoje.

Sei que há pessoas que não gostam de João Gilberto e há, aliás, quem o odeie. Tenho muita dificuldade em entender isso, assim como tenho a mesma dificuldade em entender como alguém possa gostar destas duplas modernas de música sertaneja ou da chamada música techno. Esta minha dificuldade deve-se, muito provavelmente, à escolha errada do verbo. Em lugar de entender, eu estou pensando em sentir.

O maior defeito que as pessoas apontam em João Gilberto é que suas gravações, assim como as apresentações ao vivo, são muito longas e que ele repete as músicas muitas vezes, o que torna a audição enfadonha. Não sinto assim. Consigo perceber, em cada repetição, alterações sutis na harmonia, enriquecendo a execução de cada canção. Minha convicção, aliás, é que cada alteração, se não é planejada, surge de uma busca do novo, da perfeição.

João Gilberto tem hoje 84 anos, vive recluso num apartamento no Rio de Janeiro, esquecido por todos, até por mim, talvez. O que me fez lembrar dele foi o livro Ho-ba-la-lá, do jornalista alemão Marc Fischer, que juntou algumas economias e viajou ao Brasil com a intenção de encontrar-se pessoalmente com João Gilberto, mesmo sabendo que esta empreitada é inglória. Nesta tentativa, acabou se encontrando com vários personagens que gravitam ou gravitaram em torno do cantor, o que ia enriquecendo o rol de informações que tinha do artista, seu ídolo. 

Com isso, no livro, vão se desvendando facetas, algumas conhecidas, outras inéditas de João, numa narrativa que instiga a curiosidade do leitor pra saber se ele irá, ou não, atingir seu intento.

Se ele conseguiu, não sou eu quem vai contar. Não sou estraga prazeres.


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