Livros, música, cinema, política, comida boa. Isso tudo e mais um montão de tranqueiras dentro de um baú aberto.

sexta-feira, 6 de abril de 2007

Feliz inconfidência?

Eu devo estar ficando maluco ou é essa coisa da idade avançada que está afetando minha memória. Mas eu posso jurar que esse fenômeno só começou a acontecer no ano passado.

Fui criado em uma família católica, mas a páscoa nunca me imprimiu uma marca que ficasse na memória. A páscoa, pro eu criança, sempre esteve associada apenas aos ovos de chocolate que eu ganhava, cuja característica principal era a de sempre ser menores que aqueles que eu via nas lojas pra vender.

Mais do que a páscoa, a sexta-feira santa tinha um significado muito mais marcante. Nesse dia, minha mãe negava-se a trabalhar. Não aceitava sequer varrer a casa, alegando que isso era pecado. Eu, que sempre interpretei essa sua atitude, muito mais como malandragem, do que espírito cristão, preferia ficar na minha. Afinal, minha mãe era fogo. Não valia a pena entrar num conflito com ela por uma causa tão pouco importante. E além do mais, o que me preocupava mesmo, muito mais do que o pó no chão da sala, era aquela proibição de comer carne. Carnívoro inveterado que sempre fui, era com muita má vontade que eu encarava aqueles mirrados filés de pescadinha à milanesa.

Lembro-me ainda, de grandes discussões com minha avó, sobre a motivação dessa horrenda proibição. Ela dizia que a sexta-feira santa era um dia de privações e sacrifícios. Eu, na minha fúria juvenil, contestava que não via sacrifício nenhum em trocar os nacos de carne por suculentos pedaços de bacalhau, que era o que a maioria das pessoas fazia, nessa data.

Lembro-me ainda, que uma das minhas primeiras demonstrações de liberdade e ousadia, foi quando, já adolescente, comi uma lata inteira de salsichas e contei pra todo mundo. Confesso que fiquei morrendo de medo de passar mal (a salsicha era muito ruim) ou até de morrer (por castigo de deus). Como nenhuma dessas coisas aconteceu, o restinho de fé religiosa que, porventura me restasse, se esvaiu por completo. Passei a declarar-me ateu enquanto minha mãe dizia que, na verdade, eu era um à toa.

Hoje em dia, não discuto com ninguém por causa de bobagens como essa e troco fácil, um entrecôte argentino por um bacalhau grelhado com batatas ao murro.

Mas voltando ao assombro que me fez iniciar este relato, o que tem me deixado encafifado é um fenômeno que eu só percebi no ano passado.

Estou habituado, há muitos anos a ouvir os desejos de feliz natal e feliz ano novo no final de cada dezembro. Isso acontece no escritório, no último dia de trabalho, nas lojas, enfim, em todos os lugares em que haja contato humano. E apesar de achar isso um pouco forçado, estou absolutamente acostumado com essa prática e lido muito bem com ela. Só que agora começou essa coisa de desejar feliz páscoa. Devo estar ficando realmente maluco ou então muito esquecido. Mas não me lembro, sinceramente, de que isso fosse um costume. E acho que isso só começou a acontecer no ano passado, pois foi quando percebi o fenômeno. E assim, começo a ouvir esses cumprimentos em todo lugar. Pago a conta no supermercado e a caixa me deseja feliz páscoa. O porteiro do estacionamento me deseja feliz páscoa. Ontem, no trabalho, ao se despedir, muitos colegas me desejaram feliz páscoa.

Estou atordoado. Temo que no próximo dia 20, ao se despedir de mim, alguém me deseje “Feliz inconfidência”!

9 comentários:

Diego Moreira disse...

Feliz Páscoa pra você, meu caro!


Mais um...

Marcia disse...

ei!!! eu quero que vc me deseje feliz dia do índio!!! piu piu.

Adriana disse...

Arnaldo, muito boa a sua historia como sempre, aqui na Espanha ou pelo menos La coruña es raro encontrar ovos de pascoa para vender, nao existe aquela loucura do Brasil, ovos de pascoa de todos os lados...E agora meus filhos estao grandes ja nao necessita andar Coruña toda atras de ovos de pascoa (se contentam com tabletes de chocolate).Minha mae fazia e faz (creio eu, nao sei bem, pois esta com azhemeir) todos esses ritos catolicos que eu nao entendi...na minha adolescencia rebelde achava um saco nao poder cantar, escutar musica, gritar com minhas irmas na sexta-feira santa e na verdade eu comi carne nesta sexta-feira...esqueci de comprar pescado...e tinhamos que comer algo...Mas resumindo tudo isso, como nao podia deixar de ser:
FELIZ PASCOA!!
um beijo carinhoso a ti e a Clelia do outro lado do oceano

LIRIS LETIERES disse...

Em Salvador-ba é Páscoa?
Liris Letieres

De repente... Páscoa!
Espere aí, saímos agorinha mesmo, se eu não me engano, do Carnaval não foi?
Como vamos transformar blocos de ruas e abadás, em coelhos e ovos num piscar de olhos?
Não nos damos conta, mas, o relógio do tempo é sempre implacável!
Não é como um “roscófi” que pára por longos dias! É britânico!
E esse tempo, que não quer brincadeira, corre mais que Schumacher!
(Nessas horas pensamos: Por que não é o Rubinho quem comanda o tempo?)
E lá se vem festa, sorrisos, feriados, descanso e cansaço... Mas, o que mesmo estamos comemorando? Ah, sim! A Páscoa! Aí percebo que o tempo que levei para escrever (e você para ler) levou mais tempo que planejei...Então vamos correr, façamos as listas, compremos os ovos e quando nos dermos conta, já estaremos nos desejando Feliz Natal ...
Percebe?
Será algo errado com o tempo?
Ou com nosso tempo?
Surgiu uma dúvida não foi? Então façamos o seguinte: Primeiro pare de ler esse texto pensando em outra coisa, sente-se respirando fundo...
Melhorou...
Agora, dê uma olhadinha do seu lado , tem alguém? Então? O que está esperando? Salte como um coelho e dê um beijo estalado nessa pessoa desejando a ela uma Feliz Páscoa!
E não se esqueça:
“Sempre, mas sempre mesmo, será tempo de desejar coisas boas para alguém!”.

FELIZ PÁSCOA,NATAL E DIA DO ÍNDIO!!

l disse...

só para dizer que vc citou amelhor maneira possível ever de preparar bacalhau: a posta grelhada e as batatas ao murro. Fios de azeite, e pronto. Bem vale uma missa.

:)

ah...
deu vontade de desejar feliz pascoa também!!!

Anônimo disse...

Ué? Sempre me desejaram Feliz Páscoa... e olha que já estou bem velhinha...

Graziana Fraga dos Santos disse...

eu acho que sempre me desejaram feliz páscoa...
pelo comércio todo dia seria Feliz alguma coisa, desde que vendessem e lucrassem bastante ;)

Vivien Morgato : disse...

Eu sou escrava de supertições...não deixo sapato virado, não passo embaixo de escadas, um horror.Sexta feira santa não saio de casa...rs...sério mesmo. E tenho uma mania infantil de achar que tudo é um "sinal". Pois to querendo tanto que minha vida mude, em vários aspectos, que fico achando que essa páscoa está cheia de "sinais".
Ah, boa páscoa procê....rs

Anônimo disse...

Arnaldo, me desejam feliz páscoa desde que me conheço por gente! Acho que você nunca reparou, apenas isso. :-)