Livros, música, cinema, política, comida boa. Isso tudo e mais um montão de tranqueiras dentro de um baú aberto.

sábado, 3 de abril de 2010

O baianismo e os norte-americanos

O filme Coração Vagabundo, produzido por Paula Lavigne é, fundamentalmente, um meio de veiculação para o ego de Caetano Veloso. Tem lá seus encantos, como a fotografia bem cuidada e a trilha sonora, recheada de músicas cantadas por ele, sobretudo as do disco A foreign sound, o último do baiano de que eu gostei, com um repertório desigual de músicas norte-americanas em que mistura Cole Porter e Gershwin a Kurt Cobain e Bob Dylan. Eu preferiria que fossem apenas Standards de jazz e, sobretudo, que não tivesse bobagens como Diana ou Feelings, por exemplo.

Mas, voltando ao filme, a condução da câmera, pelas mãos do diretor Fernando Grostein Andrade, acaba sendo apenas um trabalho braçal, já que segue, fielmente, os passos de Caetano e acaba, por fim, servindo de palanque para que ele possa falar sobre seu assunto preferido, ou seja, ele mesmo.

Num determinado momento, logo no início, o compositor evoca seu baianismo e faz um paralelo entre a sua importância no cenário da música brasileira e a dos, também baianos, Dorival Caymmi e João Gilberto. Achei isso interessante e, ao longo do filme, enquanto Caetano destilava sua verve, eu fiquei pensando no assunto. De fato, penso que os três tiveram uma participação decisiva, revolucionária, até, na nossa música. Três baianos, em diferentes momentos da história, com João Gilberto recebendo influência de Caymmi e Caetano sendo o que não seria, caso não tivesse existido os outros dois.

Além dos três terem vindo da Bahia e se colocado, de forma categórica, no cenário musical brasileiro, dominado sempre pelo eixo Rio-São Paulo, estes artistas estabeleceram, cada um ao seu modo, uma relação com a música dos Estados Unidos.

Caymmi, dos três, o que interagiu menos com os norte-americanos, talvez seja o único a inserir uma marca, por conta da música O que é que a baiana tem, cantada por Carmem Miranda, e que acabou dando o tom do que seria a imagem do Brasil no imaginário daquele país.

João Gilberto morou quase 20 anos nos Estados Unidos numa relação simbiótica, quase parasitária, cujo objetivo sempre foi usufruir das benesses daquele mercado. Estabeleceu-se em solo americano sem, no entanto, integrar-se àquela sociedade. Diz-se, talvez com alguma má fé, que nunca aprendeu a falar inglês com fluência.

A relação de Caetano com os Estados Unidos é de exagerada admiração. Isso fica claro no filme e já é bem conhecido de quem acompanha sua carreira e tem ouvido o que ele fala sobre o assunto. A mim, incomoda um pouco essa quase submissão, essa assunção da condição de colonizado, de subdesenvolvido. Caetano lida bem com essa convicção de atraso que ele tem, da nossa sociedade, em relação à da América do Norte. O que me espanta não é isso, mas, sim, que essa convicção se estenda, também, à nossa música, que ele considera menor, comparada à do norte do continente. Gosto muito de certo tipo de música americana, muito provavelmente diferente do tipo de música americana que encanta Caetano. Mas isso não tem importância. Isso é questão de gosto.

Sobre essa questão, aliás, fico mais na linha do que compôs um baiano que veio antes de Caymmi e que foi cantado por baianos que vieram depois de Caetano.




Brasil Pandeiro (Assis Valente) – Novos Baianos

2 comentários:

Valéria Martins disse...

Bem, eu sou suspeita para falar... adoro o Caetano! Peguei o filme no DVD, mas confesso que não tive paciência para ver até o fim. Mas continuo amando o Caetano!

Beijos, querido Arnaldo. Boa Páscoa!

Unknown disse...

Arnaldo, o Caetano é um babaca. O retrato fiel da era FHC. Uma era que, queira o povo, jamais voltará a ditar as regras no Brasil.