Livros, música, cinema, política, comida boa. Isso tudo e mais um montão de tranqueiras dentro de um baú aberto.

domingo, 4 de abril de 2010

Política e futebol

Neste ano, teremos dois eventos muito importantes para nós, o povo brasileiro. 2010 é ano de Copa do Mundo e de eleições para presidente. São dois eventos, entretanto, que não me animam, justamente por que futebol e política são dois assuntos aos quais eu dou extrema importância.

Justamente por gostar muito de futebol, tenho certa cisma com a Copa do Mundo. Me incomoda essa cultura do ganhar a qualquer custo que o espírito desta competição impinge às nossas mentes. Essa coisa da garra e da disciplina tática em detrimento do prazer e da arte. Percebi isso aos 22 anos, quando vi jogar uma seleção que não venceu a disputa, mas encheu meus olhos de admiração. Depois de ver juntos, em campo, Sócrates, Zico, Júnior e Falcão, nunca mais tive o mesmo prazer em uma Copa do Mundo. Nenhuma outra seleção, vencedora ou não, depois daquela, me causou alguma emoção. Sei que sou diferente. Sei que sou como um ser extra-terrestre por gostar mais de futebol bem jogado do que de títulos de campeão. Fazer o que? Sou assim, simplesmente.

Gosto muito de política, também. Tenho extrema convicção de que é através dela que podemos construir um mundo melhor, mais justo, mais equilibrado. Abomino as formas de governo que suprimem a liberdade política com o argumento da governabilidade. Por isso mesmo, sou avesso às ditaduras, sejam elas de direita ou de esquerda.

Embora aprecie o jogo da política, o processo eleitoral é o que eu menos gosto, até porque vira um clima de campeonato, um processo de ganhar a qualquer custo, muito parecido com o da Copa do Mundo. Principalmente, nos últimos tempos, em que o marketing virou ciência, em que a imagem pasteurizada dos candidatos, com seus sorrisos super brancos, seus punhos cerrados, suas mangas arregaçadas, são mais eloqüentes que suas idéias ou seus planos de governo. Sem falar no posicionamento da mídia, tão tendenciosa, para um lado e para o outro.

Os jornais e revistas adotam posição de apoio e de crítica aos candidatos segundo suas convicções e interesses. Não vejo muito mal nisso. Ruim é quando os fatos são falseados, as informações manipuladas, os interesses escondidos. Revestida de sua tradicional pose, a Folha de São Paulo critica duramente o atual governo, tentando atingir Dilma. A Veja faz a mesma coisa. Não me oponho a que a imprensa critique, creio que é esta uma de suas principais funções. Estaria no papel dela, se não tratasse com tanto carinho o ex-governador de São Paulo, principal oponente da ex-ministra. Caminho inverso faz a revista Carta Capital, que bate em Serra como a sua polícia bate em bandido e releva qualquer deslize do governo federal.

Saindo da mídia mais poderosa e entrando nos blogs mais conhecidos, temos de um lado, Reinaldo Azevedo espinafrando Lula e a sua candidata e, do outro, Paulo Henrique Amorim tratando Serra como se fosse o maníaco do parque. Ambos, sem nenhuma preocupação em ser, minimamente, elegantes.

Somando-se a isso, o equilíbrio que as pesquisas estão mostrando (fica fora a última pesquisa do Vox Populi, vergonhosamente tendenciosa em seu método) indica que o embate será bem parelho e feio, como uma final entre Itália e França, decidida nos pênaltis.

Por mim, além da disputa não animar, ela também não incomoda, até porque não vejo tanta diferença assim entre os candidatos. Poderia ser muito pior. Poderia ser Alckmin ou Arthur Virgílio contra Marta Suplicy ou Mercadante. Poderia ser o DEM contra o PSOL. Poderia ser muito pior.

Serra e Dilma são, ambos, autoritários e antipáticos. Os marqueteiros de plantão irão se encarregar de torná-los mais palatáveis à massa que se informa pela televisão. Serra terá que se esmerar para não bater em Lula, que goza de popularidade inédita a um presidente em final de mandato. Dilma, por seu lado, terá que se manter agarrada a Lula e não largar mais até outubro, novembro. Essa é sua herança. Como se vê, disputa folgada só haveria se o candidato fosse o próprio Lula. Aliás, fosse ele o candidato, teria meu voto. Não sendo, minha escolha poderá ir para Dilma ou para Serra, tanto faz.

Gosto de Lula. Simpatizo com a pessoa e admiro o político. Simpatia e admiração que, entretanto, nunca foram suficientes para calar minhas eventuais críticas ao seu governo. O que tem me incomodado, nesses 8 anos de governo Lula, é, justamente, esse clima de torcida de futebol. Ou se critica tudo nele, ou trata-se o presidente como um santo. Nem uma coisa nem outra. E, se de um lado, ao elogiar o governo encontro pela frente uma turma preconceituosa que só enxerga em sua figura o nordestino de origem pobre e detestável (àqueles olhos), do outro, ao criticá-lo encontro outra turma, me patrulhando, como se isso fosse blasfêmia.

Pouco me importa quem vai vencer as eleições. Só uma coisa, porém, me alivia. Acho que vou poder falar mal do governo com um pouco mais de tranqüilidade. Afinal, o que pode ser mais prazeroso de se fazer na frente de uma cerveja gelada, num boteco bem imundo?

2 comentários:

Unknown disse...

Bom vê-lo em forma, Arnaldo! Seu texto foi preciso e é quase como penso o futebol e a política. Nesta, em especial, discordo apenas de sua posição em relação ao tanto faz. Acho que fará muita diferença uma vitória de Serra sobre Dilma - neste caso, para pior. Por isso é que entrarei de cabeça na campanha da candidata lulista. Não porque nutra por ela muita simpatia. Meu voto em Dilma, aliás, será menos convicto do que meu voto em Lula. Mas, pelo menos, será a garantia de que os programas de governo implantados nestes oito anos - muitos dos quais com resultados positivos incontestes - terão continuidade. Um governo Serra não seria tão catastrófico quanto o de um Geraldo Alckimin ou, Deus me livre!, de um Arthur Virgílio, mas ainda assim representaria um retorno das forças mais conservadoras e retrógradas que sempre mandaram neste País. Seria, além disso, um atestado de nossa incapacidade política de compreender o momento pelo qual o Brasil está atravessando. Apesar de o PT ter abandonado algumas de suas bandeiras históricas, logrou conquistas importantes, muitas das quais simbólicas -- e, assim como no futebol, o plano simbólico é tão importante quanto o plano concreto. O exemplo do futebol-arte é um bom exemplo disso: nem sempre ganhar em campo é a única coisa que importa. A dignidade e a honra são necessárias para manter viva uma ideia, um exemplo, enfim, um símbolo de pátria. Com Lula -- e certamente com Dilma -- o Brasil seguirá mantendo uma postura menos submissa no xadrez da política internacional. Isso sem falar no avanço -- mais uma vez simbólico -- que representaria uma mulher na presidência, sucedendo um operário. A democracia é feita também destes pequenos avanços que -- creio piamente nisso -- tornam a vida menos chata e o exercício da política menos entediante. Recentemente estive em Fortaleza, a trabalho, e lá travei um diálogo interessante com uma pesquisadora finlandesa. Quando soube que Serra estava à frente de Dilma nas pesquisas de intenção de voto, achou aquilo incompreensível, absurdo. Ora, se Lula terminará o mandato com quase 80% de aprovação, como era possivel que seu maior oponente, um homem de centro-direita, pudesse ser considerado o favorito para sucedê-lo? Não é, de fato, uma loucura? Grande abraço!

cris K disse...

Oi Arnaldo, você falou de um momento histórico para mim viu. Eu vi essa seleção, e apesar da pouca idade, me indignei tanto que abandonei o prazer do futebol. Não me esqueço da camiseta rasgada do Zico, do grito de fdp entalado na garganta. Sofri que nem gente grande naquele dia. Perdemos uma copa e eu perdi uma paixão. Hoje, acho que futebol virou títulos,dinheiro, força física, montanha de músculos (ou panças) e colecionadores de loiras. Infelizmente... perdemos, perdi.
Abraço.
Cris