Livros, música, cinema, política, comida boa. Isso tudo e mais um montão de tranqueiras dentro de um baú aberto.

sexta-feira, 4 de junho de 2010

As certezas e as desilusões

Dias atrás, escrevi um texto em que abordava a sucessão presidencial, passando a sensação que tenho de que não sinto tanta diferença entre escolher o candidato tucano ou a candidata do presidente Lula. Se pudesse, não votaria em nenhum deles, mas também não me animo com o discurso de Marina Silva, que aliás, nunca me despertou muito interesse. Votar em branco é uma alternativa que nunca considerei plausível, principalmente pra quem, como eu, sou de uma época em que votar era proibido.

Minha indecisão é absolutamente sincera. Por desinteresse, ignorância, ceticismo ou todos estes ingredientes juntos, não tenho uma predileção por qualquer um dos candidatos, até mesmo, porque não reconheço em nenhum deles um projeto consistente de governo para o Brasil. Considero, tanto o projeto petista quanto o tucano, como simples planos de detenção de poder e defesa de interesses de grupos restritos e oportunistas, como tem sido ao longo da história republicana do país.

Reconheço que não tenho tido disposição para buscar, nos jornais, informação que me oriente, mas por dois motivos acredito que esse interesse não vai se manifestar. Em primeiro lugar, os jornais não informam de maneira imparcial. Alguns até fingem, mas a maioria é escrachadamente partidária, pra um lado ou pra outro. O pouco que vejo e ouço, são manifestações de criticas pessoais, absolutamente hipócritas, em relação ao candidato adversário. Não tenho tanta paciência e reside aí a segunda razão para o meu descaso. Além de tudo isso, os marqueteiros de plantão já estão operando seus milagres e conseguiram sumir com as olheiras da Dilma e ensinaram o Serra a sorrir sem mostrar seus caninos de vampiro. Conseguiram transformar ambos em pessoas simpáticas, coisa que nunca foram, nenhum dos dois.

Outra alternativa, seria verificar ao lado de quem cada candidato caminha. Mas aí sim é que as coisas se confundem mais. Afinal, não dá pra confiar em quem anda de mãos dadas com Arthur Virgílio, José Sarney, Renan Calheiros ou Álvaro Dias.

A última chance seria olhar pros meus amigos, pessoas em quem confio e das quais não tenho nenhuma dúvida a respeito das intenções. E mesmo ali, encontro uma equânime divisão. Há quem penda para o Serra e quem clame pela Dilma. E enxergo neles, dos dois lados, uma espécie de cegueira que só se explica pela paixão. Uma paixão que faz com que se classifique Serra como o mais selvagem dos ultra-direitistas e Dilma como um gênio da gestão pública. Ou, então, que vejam Lula como um subdesenvolvido analfabeto e Fernando Henrique Cardoso como o maior estadista de todos os tempos.

Nada disso é verdade. Lula não é santo e Serra não suga o sangue de virgens desamparadas. Dilma nunca foi uma terrorista sanguinária e Fernando Henrique não é o ícone máximo do pensamento moderno mundial. Todos têm certos vícios e muitos pecados.

Por fim, minha filha, que vai votar em Dilma, não se conforma que eu tenha alguma dúvida. Mas isso eu consigo entender. Ela tem aquela certeza absoluta que acomete os jovens. Eu também já tive todas as certezas do mundo. Hoje, carrego muitas dúvidas e algumas desilusões.

4 comentários:

Unknown disse...

Arnaldo:
O PT não mantém, em seu portal, nenhum tipo de ataque aos adversários. O portal do PSDB, ao contrário, está repleto de ataques covardes e traz link para um site chamado "Gente que Mente", com graves acusações falsas e comentários racistas. Imagine se fosse o contrário. Imagine se o PT tivesse, em sua página oficial, um espaço como este para esculhambar o PSDB e a militância tucana. Como você acha que a imprensa se comportaria?
Pergunto porque você disse que a imprensa é, em sua maioria, partidária. OK. Mas tirando publicações declaradamente de esquerda (como a Caros Amigos), o que temos é o discurso da oposição espalhado em editoriais, artigos, cartas de leitores e reportagens tendenciosas. A mídia fechou com Serra, sem exceção. Não penso que escrever sobre essa vergonha, que denunciar essas mentiras, que criticar o jogo sujo da imprensa privada, seja uma simples “paixão partidária”. Eu, por exemplo, não sou petista.
Sei que posso estar incluído na sua lista de amigos que apresentam "uma espécie de cegueira". Você não cita nomes, mas presumo que me leia de vez em quando. Se ler atentamente, verá que as críticas que faço não trazem ataques pessoais, como costumam trazer os comentários dos leitores tucanos no meu blog. Provo tudo o que afirmo e não sou leviano. O blog é minha trincheira, minha única forma de fazer frente àqueles que nos levam a crer que os políticos são todos iguais. Infelizmente, você parece ter acreditado nesta esparrela.
Individualmente, sua escolha não determina o resultado da eleição. Mas é assustador imaginar que milhões de pessoas, neste exato momento, podem estar pensando a mesma coisa. É triste, porque Dilma e Serra são muito diferentes. Sei que, no fundo, você sabe disso. Dilma representa a continuidade de um projeto iniciado pelo governo Lula. Este projeto tem base e está disponível na internet, acessível a todos os que queiram consultá-lo. Qual o projeto do PSDB para o Brasil? Simplesmente não há projeto. O que nos leva a crer que, uma vez eleito, Serra voltaria a adotar a política neoliberal que quase quebrou o país no mandato de FHC.
Ora, sob o governo Lula melhoramos muito em relação ao passado, sobretudo nos aspectos econômicos e sociais. É fato. Se este avanço é fato, seria natural que optássemos pela continuidade do projeto lulista, certo? A não ser que você tenha se convertido em um extremista de esquerda que queira implantar a "ditadura do proletariado" no Brasil (tens a opção de votar no Zé Maria, do PSTU), ou que tenha se bandeado para a direita, votar em Dilma é um caminho natural.
Por fim, o lamentável desfecho de seu texto ironiza a "certeza absoluta" que acomete os jovens, como se fossem uns bobos, ingênuos, desprovidos de senso crítico. É o que dizia, por exemplo, o meu avô. Ele morreu antes de ver Lula na presidência, mas lembro que passou os últimos vinte anos repetindo a mesma ladainha: "Este cara (Lula) NUNCA será presidente! O povo brasileiro JAMAIS vai eleger um homem desses". Ele gostava de frisar o NUNCA e o JAMAIS, com aquela convicção arrogante que os velhos geralmente adquirem quando perdem a capacidade de ousar. Quando eu retrucava e dizia que sim, que era possível, ele ria com superioridade e dizia: "Um dia você vai ver que eu estava certo. Vocês jovens são muito cheio de certezas, mas não entendem nada da vida". Meu avô passou, Lula se tornou presidente. Quem tinha razão?
Já dizia Antero de Quental: "A futilidade num velho me desgosta mais do que a gravidade numa criança". Não tome seu desalento e suas desilusões como um sinal de maturidade. Elas podem levá-lo à futilidade, como aconteceu com meu avô. O pessimismo crônico é uma doença da alma que pode ser curada com um pouco de boa vontade, de boas leituras e de muita paciência histórica. Temos caminhado, estamos mudando para melhor. Mas o percurso é longo. Há que se ter paciência.
Abraço!

Arnaldo Heredia Gomes disse...

Caríssimo Bruno,

É claro que eu te leio e você sabe disso. E em nenhum momento eu acusei algum amigo de fazer ataques pessoais a qualquer candidato. Os meus amigos partidários da Dilma não fazem e os amigos partidários do Serra também não. Mas leio muita gente fazendo isso, de um lado ou de outro. Basta olhar as páginas da Veja ou da Carta Capital. Ler o blog do Reinaldo Azevedo ou do Paulo Henrique Amorim. Não acho que todos os políticos sejam iguais, mas também não engulo nenhuma postura que leve a uma idéia de divindade ou messianismo de político nenhum. Se você lê este espaço com alguma freqüência, sabe que sempre resisti a qualquer patrulhamento que me impeça de criticar seja quem for. Por mais que eu reconheça o valor do governo Lula, nunca vou me permitir ficar calado quando tiver alguma crítica a fazer. Gosto de me sentir livre para dizer o que eu penso e só me incomodo com as críticas alheias quando elas estão revestidas de preconceito.

Quero ainda ressaltar que, evidentemente não me converti em extremista de esquerda e quero crer que você, na realidade não acredita, de verdade, que eu tenha me bandeado para a direita, pois, acreditando nisto, estaria me ofendendo e isso não é de seu feitio. Eu, apenas não tenho as ilusões que já tive e isso eu não posso falsear. Seria hipócrita se fingisse que ainda tenho tanta fé.

E finalmente, sobre essa questão de idade, acho as certezas absolutas extremamente saudáveis nos jovens. Nos velhos, estas certezas absolutas sempre levam aos enganos. Não me envergonho de minhas dúvidas e não omito minhas incertezas pois elas são reais. O resto, fica por conta de uma desilusão legítma e verdadeira, que, espero sinceramente, não leve à este seu sombrio prognóstico de futilidade.

Um grande abraço

Unknown disse...

Querido Arnaldo:

é claro que não o coloco entre os "arrependidos" que se bandearam para a direita. Muito menos penso que tem se tornado um "velho fútil", como era o meu avô. Primeiro porque você não é um velho. E segundo porque a futilidade é algo que absolutamente não coaduna com seus valores pessoais. O que fiz foi apenas um alerta, pois tenho visto uma certa tendência, entre as pessoas com mais de 40 anos, de nivelar por baixo todas as coisas. Não só a política, mas todas as coisas mesmo. É como se, depois de certa idade, o mundo obrigatoriamente se convertesse em algo desprovido de beleza, paixão e possibilidades. É como se não tivéssemos o direito de continuar fazendo as coisas com paixão - inclusive a política. Não culpo totalmente estas pessoas porque durante duas gerações vivemos sob a batuta do neoliberalismo, um modelo de economia (e de vida) para o qual a paixão significa o fracasso, a ignorância, o atraso, a irracionalidade. Não é o seu caso, volto a dizer. Até porque eu, que já passei dos 30, também não tenho mais o ímpeto do passado quando penso em política. Tive, como todos, minhas decepções - que foram muitas, muitas mesmo. Porém, ao mesmo tempo, me sinto vacinado, mais preparado para fazer uma análise ou tomar uma posição. Acho que a perda das ilusões tem o seu lado positivo também, acho que ela nos amadurece, nos abre os olhos para a realidade. A política, Arnaldo, é um jogo sujo. É por isso que Lula tem de apertar as mãos de José Sarney e costurar alianças com ex-inimigos públicos. É a arte da hipocrisia e eu jamais poderia cultivá-la, porque não sei ser hipócrita. Não gosto da política neste sentido. Esse jogo de interesses me entedia (aliás, como todo jogo que não seja o futebol). Gosto da política quando ela se torna um debate de ideias e um confronto de projetos. É neste sentido que levo a minha discussão. Mas já nos entendemos, certo? Você ainda tem alguns meses para se decidir e a dúvida tem seu lado bom também. Desconfio dos homens sempre seguros de tudo (sou o rei das dúvidas, acredite). Apesar disso, tenho a certeza de que você acompanhará o voto da Cecília. Grande abraço!

Arnaldo Heredia Gomes disse...

Bruno,

É muito provável que eu vá acompanhar o voto da Cecília, já qu, como você mesmo disse, ela ainda tem alguns meses até a eleição e pode mudar de idéia.

Deixando a brincadeira de lado, posso muito bem votar na Dilma e isso vai ser absolutamente natural e condizente com as convicções que "ainda" tenho.

O que não vou me furtar, nunca, é o direito de criticar abertamente o governo, seja ele exercido por ela ou por José Serra. É a esta cegueira que eu venho me referindo há algum tempo (há 8 anos, mais precisamente). É esta cegueira, esta falta de crítica, que, em minha opinião, faz tanto mal ao Brasil quanto fizeram os anos do governo Fernando Henrique. Se não houver uma crítica responsável ao governo Dilma, abre-se espaço para a crítica preconceituosa, como o que ocorreu com o governo do Presidente Lula.

Se tivesse havido uma crítica e uma oposição responsável ao governo Lula, talvez ele tivesse sido até melhor do que foi e não tivéssemos tido um governo com Hélio Costa, Sarney Filho, Edison Lobão, Henrique Meirelles e Nelson Jobim. Se tivesse havido uma crítica mais corajosa ao governo Lula, talvez ele tivesse se aliado ao lado menos pior do PMDB.

Um grande abraço.