Livros, música, cinema, política, comida boa. Isso tudo e mais um montão de tranqueiras dentro de um baú aberto.

domingo, 26 de agosto de 2007

De novo, história

Foi por absoluta covardia que resolvi estudar engenharia. O que eu queria, mesmo, era estudar história. O fato de ter feito o curso técnico em eletrônica, aliado a uma convicção de que cursando história eu teria uma carreira com mais dificuldades de ganhar dinheiro, me levou pra engenharia. Mal sabia eu que, em qualquer carreira, é muito difícil alcançar um patamar no qual se seja bem remunerado. Tem que ralar muito e demora pacas.

Além do mais, ao terminar o curso médio (naquele tempo chamava-se colegial), comecei a trabalhar na indústria e, já ganhando um salário que eu julgava bom (leda ilusão), seguir pra faculdade de engenharia era o caminho natural.

Pra compensar isso, dirigi todas as minhas leituras para os livros de história, que dividiam minha estante com aqueles que tratavam de cálculo, física e transistores. E assim, minhas leituras, nessa época, desprezaram as obras de ficção, que tanto tinham me seduzido nos anos anteriores. Larguei a prosa e a poesia e fiquei, cada vez mais, focado em textos que tratassem de política, filosofia e biografias.

Há tempos fiz as pazes com a ficção, quando me caiu nas mãos o livro Quase Memória do Carlos Heitor Cony, que me fez voltar aos romances e contos, com voracidade. E, durante todo este tempo, tenho deixado de lado os livros de história. A exceção foram os livros de Elio Gaspari, da quadrilogia que trata da ditadura militar, que eu li de um só fôlego. E agora, acho que pra matar as saudades de outros tempos, acabei de ler o livro D. Pedro II: Ser ou não ser, da coleção Perfis Brasileiros, escrito por José Murilo de Carvalho.

Nos meus tempos de devorador de livros de história, sem nenhum critério mais acadêmico, o que me seduzia era o período republicano, sobretudo depois dos anos 1930. A história colonial e o império nunca tinham me provocado muita curiosidade. Este livro, entretanto, mudou isto. E passei a entender por que a figura de Pedro II sempre foi tão simpática ao povo brasileiro, principalmente na cidade do Rio de Janeiro. Avesso à pompa e circunstância, típicas da nobreza e dos regimes monarquistas, D. Pedro era um homem à frente do seu tempo. É uma pena, aliás, que esta frase tenha virado um clichê, pois no caso dele, ela se aplica perfeitamente.

Um homem afeito às artes e à ciência, tinha como principal deficiência a capacidade de articulação política, numa época em que os partidos conservador e liberal mandavam na cena, no Brasil. Apesar disso, seu reinado durou 49 anos, apenas suplantado pelo da Rainha Vitória, na Inglaterra, à mesma época. Teimosia e indecisão foram duas características que o fizeram cometer, ao menos dois erros estratégicos e que acabaram lhe custando o trono. A primeira característica o levou a insistir na continuidade da guerra do Paraguai, num momento em que uma solução diplomática poderia ter dado um fim à disputa, evitando as atrocidades cometidas pelo exército brasileiro no final do conflito. Sua posição em relação à abolição, claramente favorável, não foi acompanhada de uma atitude mais firme, levando o Brasil ao vergonhoso fato de só ter abolido a escravidão mais de vinte anos depois dos Estados Unidos. Claramente simpático ao ideal republicano, viu este sistema ser implantado através de um golpe de estado, o que fez o país regredir muitos anos no que diz respeito à democracia.

Aliás, todas as grandes transformações políticas no Brasil, a partir de então, foram resultado de golpes de estado. Triste vocação de um país cujo povo resiste e insiste na alegria.

Terminado o livro, me dá ganas de continuar estudando história, aprofundando-me em cada época, cada detalhe, cada crise política. Resistirei bravamente. Volto pra alguma ficção, já que estou convencido que é a diversidade que me enriquece.

6 comentários:

Diego Moreira disse...

O 'barbudo' foi um sujeito fantástico. Em verdade um homem à frente do seu tempo, na concepção mais profunda da expressão.
Belo texto, malandro!

Claudia Lyra disse...

Também gosto de história. Vou procurar esse livro por aqui, pois D. Pedro II realmente me é muito simpático.

Graziana Fraga dos Santos disse...

coincidentemente pensei em fazer história, acabei na comunicação... sempre ótimas dicas por aqui!

Maria Helena disse...

Arnaldo,
Sempre gostei de história (nunca pensei como profissão),do Brasil e Geral. Tenho meus personagens prediletos e por acaso D.Pedro II é um deles.
Adorei história da arte, é fascinante. Estudar todos aqueles genios maravilhosos da pintura,
escultura,arquitetura,para mim superou até,os pontos de fuga,as
plantas baixas as perspectivas os
projetos de desenho arquitetônico
aula que eu apreciava muito.
Engenharia é uma escolha e tanto, parabéns.
Bjs

Eli Carlos Vieira disse...

"[...]Triste vocação de um país cujo povo resiste e insiste na alegria[...]"

Gostei do D.Pedro simpático da Claudia!
História é realmente fascinante, seja como profissão, ou pela história em si.
Realmente é estranho duelar entre exatas e humanas.Mas erros estratégicos as vezes funcionam, cedo ou mais tarde, deixam seus frutos!

Abraço
:-]

Anônimo disse...

José Murilo é mesmo muito bom. Implico um pouco com a posição politica, que o levou a ser chamado de monarquista por alguns historiadores.De qq forma, vários historiadores concordam com a grande simpatia que Pedro II tinhha entre as classes populares.
Leia Os Bestializados dele e a Formação das Almas, acho que vc vai gostar.beijos.