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quarta-feira, 3 de outubro de 2018

Extremismo assimétrico


Pululam na imprensa (e, por conseguinte, na internet) editoriais, artigos e textos esparsos com o discurso de que a disputa que se avizinha, após o próximo domingo, será entre a extrema-direita e a extrema-esquerda. Até mesmo Ciro Gomes está pegando carona nesta conversa, menos por convicção, mais por oportunismo (coisas de estratégia política mesclada com desespero). Nada, porém, é mais falso do que este discurso. 

Posicionada à esquerda do PT, encontramos uma enorme diversidade de agremiações (partidárias ou não) e, mesmo dentro do partido, há um balaio com divisões e subdivisões que abrangem um espectro inimaginável, de tão diverso. Há quem defenda que nem mesmo de esquerda o PT pode ser classificado, mas, aí, já reside certo exagero.

À direita de Bolsonaro, não há nada nem ninguém.

Para quem prefere os desenhos às palavras, basta imaginar um segmento de reta, na horizontal, e visualizar o PT e uma enxurrada de outros agrupamentos como PSOL, PC do B, PSTU, MST, MTST, entre outros, alguns próximos e outros mais distantes, mas todos à sua esquerda. É possível enxergar, no outro extremo, um Bolsonaro solitário, bem longe das outras agremiações conservadoras e sem ninguém, nem nada, à sua direita. 

A visualização desta imagem mental é mais do que suficiente para perceber o quanto este discurso do embate entre extrema-direita e extrema-esquerda é fantasioso (a quem tiver dificuldade em visualizar figuras imaginárias, sugiro que desenhe).

Na minha juventude eu me entediava com as intermináveis discussões nos centros acadêmicos entre stalinistas e trotskistas, evocando figuras emblemáticas do pensamento de esquerda com discursos repetitivos e desconectados da nossa realidade. Eram discussões inúteis, mas ficava muito clara a posição de cada grupo na tal linha imaginária. Chegava a ser divertido (muito menos divertido, entretanto, era o que se passava nos porões do regime).

O pessoal mais jovem não vivenciou essa realidade, e, talvez por isso, este discurso desproporcional ganhe adeptos. É compreensível. Vejo, entretanto, muita gente da minha idade comprando esta ideia da simetria entre os dois extremismos o que, aparentemente, mostra que àquela época, não tomava conhecimento do que se passava à sua volta, que dirá no país inteiro (seja na superfície, seja no subterrâneo).

Fico imaginando o que é que essas pessoas ficavam fazendo na faculdade e, antes que alguém diga que ficava estudando, devo esclarecer que, nessa idade, sempre tive energia para estar antenado com o que ocorria à minha volta e, ao mesmo tempo, aprender a utilizar as transformadas de Laplace (saudade daquela vitalidade!!!).

Não há nada de ilegítimo em se situar à esquerda ou à direita. São posicionamentos absolutamente pessoais, que eu respeito. A pessoa pode ser progressista ou conservadora, solidária ou individualista. Pode acreditar num modelo de estado que atue para garantir as mesmas oportunidades para todos ou num modelo em que o mercado ajuste as discrepâncias sociais aos seus interesses. Tudo isso, repito, são posições legítimas e pessoais. Depende dos valores de cada um.

As posições extremistas, entretanto, mesmo as legalmente admissíveis (a escravidão, há 131 anos era legal, no Brasil), podem ser ilegítimas e não têm meu respeito.

Na realidade de hoje, o extremismo está fortalecido de forma absolutamente assimétrica, apenas de um lado.



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