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terça-feira, 30 de outubro de 2018

Simbolismo e conteúdo

Não sou muito afeito a ícones e símbolos. Minha iconoclastia, entretanto, é branda. Não chego ao ponto de destruir símbolos ou queimar bandeiras. Só não me agrada a ideia de idolatria a monumentos ou adoração de imagens. Para resumir, sou mais pelo conteúdo que pela forma.

Nesses meses de campanha eleitoral, foi muito comum a utilização da bandeira e do hino brasileiros, por parte dos seguidores do Nefasto, para ostentar um pretenso patriotismo*. Estes dois símbolos passam ao largo de minha concepção de pátria. Pátria, para mim, se refere à terra e ao povo que nela vive. Vincular a pátria, exclusivamente, a estes símbolos, configura patriotada e não patriotismo.

Além disso, confesso que tenho certa má vontade com nossos símbolos, tanto o hino quanto a bandeira.

Do hino me agrada muito a melodia, supostamente composta por Francisco Manuel da Silva. Ocorre, porém, que os primeiros compassos desta melodia são idênticos ao Responsório Sétimo de Matinas de Nossa Sra. da Conceição, do Padre José Maurício Nunes Garcia, principal compositor brasileiro daquele período, de quem Francisco Manuel, aliás, um compositor obscuro, foi aluno.

Não é o plágio na melodia do hino, entretanto, que me incomoda. Há outros hinos acusados de plágio, mundo afora. Há quem encontre similaridades exageradas entre o hino do Uruguai a um trecho da ópera Lucrezia Borgia, do compositor italiano Donizetti, assim como a introdução do hino da Argentina é um tanto parecida com a Sonatina número 4, opus 36, de Clementi. Há outros exemplos, mas, isso importa pouco. A melodia do nosso hino, para o meu gosto estético, é belíssima.

Minha má vontade é com a letra de Joaquim Osório Duque Estrada. Além de rebuscado, o texto é mentiroso, o que se observa logo no início. Afinal, todos sabemos, povo nenhum, heroico ou não, emitiu qualquer tipo de brado, muito menos retumbante, por ocasião da proclamação da independência, que não passou de um arranjo entre a elite local e o representante da Coroa portuguesa, à época.

Minha reserva, quanto à bandeira, não está na combinação de cores, que, aliás, me agrada. Nem na disposição das formas, embora me pareçam um exercício de geometria. Minha cisma é com a frase na faixa.

Tomada do positivismo de Augusto Comte, corrente filosófica cujo lema era: "O Amor por princípio e a Ordem por base; o Progresso por fim", os articuladores da proclamação da república resolveram retirar, exatamente, o item que mais me seduz. Afinal, mais do que ordem e progresso, é o amor, em minha forma de ver o mundo, que deveria servir de lema ao povo de uma nação.

Repito, não sou iconoclasta ao ponto de defender a destruição de símbolos e bandeiras. Prefiro, entretanto, ícones cujo conteúdo seja, ao menos, verdadeiro.

Afinal, como eu já disse, sou mais pelo conteúdo que pela forma.


*Essa gente, aliás, tem grande dificuldade em escolher seus símbolos. Haja vista a camiseta da CBF, indumentária elegida pelos articuladores das manifestações de 2014. Embalagem da tramoia que apeou Dilma Rousseff do poder. Há instituição mais imaculada que esta?


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